segunda-feira, 10 de agosto de 2015

Para aquele que me chamava de "filha"



Pai
Quantas vezes te deixei sentindo muitas saudades minhas. Mal sabia que um dia minha sina seria ter tantas saudades suas.






sábado, 8 de agosto de 2015

Cemitérios são para os vivos

Ano passado um professor recomendou que nós alunos fossemos conhecer o cemitério Mt Auburn, que fica uns 20 minutos andando de Harvard. Ele nos contou que foi la que, décadas atras, ele dava passeios longos com quem viria a se tornar sua esposa. Ele disse que alem de ser um lugar lindo, era também uma grande “lição de finitude”, que nós devíamos aprender. Por dentro, eu ri. Ja estava tao cansada das tais lições de finitude dessa vida.

Hoje, quase um ano depois, resolvi conhecer o cemitério. Os últimos dias tem sido estranhos, é agosto. Tem aniversario do meu pai, dia dos pais no Brasil, e aniversario de 7 anos da morte da minha mãe. Eu sempre lembro desses dias de agosto de 2008, tao tristes, angustiantes, cheio de simbolismos estranhos. O tempo passa, e sinto minha mae se tornando cada vez mais uma memoria. Parece que aquela vida que eu tinha quando ela estava aqui era uma outra vida. Parece tao longe! A ultima vez que conversei por um longo tempo com ela, foi sua ultima noite fora do hospital. Ela tinha piorado, eu sabia que estava chegando a hora. Deitei na cama do lado dela, e ela me contou partes da sua vida por horas. Me contou sobre como tinha sido infeliz ate casar com meu pai, como ele melhorou a vida dela. Ela que não teve mãe, aprendeu a ser mãe, e gostava demais. Minha mãe foi a pessoa que mais me influenciou, mas a cada ano tenho mais anos sem ela.  

Resolvi ir ao cemitério para ter lições de humanidade. Eu sei que eu ja aprendi a licao que tristeza faz parte da vida, que algumas memórias felizes as vezes ficam meio tristes e viram saudade (pra quem viu Divertidamente/Inside Out, as memórias felizes que eram tocadas pela tristeza tinham que se chamar “saudade”!!!). Mas as vezes ainda me pego me achando sozinha nessa dor. A verdade é que morrer é uma certeza. É a parte mais real do que nos faz parte desse mundo, e todas as criaturas viventes. Mas a lição que eu fui aprender é que o peso do significado que coloco nesse luto é parte do que nos faz humanos. Nós criamos os cemitérios, nós remoemos memórias, nós nunca esquecemos quem morre, nós amamos pra sempre quem agora só aparece nos sonhos. No lindo cemitério que conheci hoje vi muitas lapides, que ao invés de ter nomes, dizia apenas Mother ou Father, muitas delas lado a lado. Ao longo dos anos, desde 1831, ao se deparar com a morte de um pai ou mãe, alguém quis que eles fossem lembrados não por nomes, mas pelo maior papel que eles tiveram em vida: ser pais. Um lugar lindo, onde a única coisa que restou foi amor.












“Perhaps we become accustomed to our grief and, as it becomes increasingly familiar, increasingly part of the emotional landscape, it becomes a dullness. But there is no closure, no forgetting. One mourns those one has loved who have died until one joins them. It happens soon enough.” 
-David Rieff

domingo, 10 de maio de 2015

Mãe, queria te contar...

Tanta coisa que eu queria te contar. 

Esses dias me lembrei das muitas e muitas vezes que eu encostava na pia de casa enquanto você lavava louça, e te contava sobre a escola e sobre as coisas que eu queria fazer. Você sempre confiou que eu sabia escolher e sempre me fez acreditar que eu poderia chegar onde quisesse. Você acreditava no melhor lado de mim. Acho que há uns 12 anos essa cena da pia acontecia quase todos os dias. Eu te falava que eu queria ir pra São Paulo, queria estudar na USP, queria queria queria tanta coisa.

Você viu aquele sonho acontecer, me apoiou sem limites. Mas tantos outros sonhos  você não viu... Quando fiz intercâmbio, quando me formei na faculdade, quando consegui meu primeiro emprego. Acho que por isso que não quis casar com festa, e não gosto da ideia de ter filho. O que mais você não vai ver? 

Esta semana termino meu mestrado em Harvard, e daqui três semanas tem uma cerimonia super bonita e tradicional, em que todos os formandos de graduação, mestrado e doutorado se reúnem no gramado de uma das melhores universidades do mundo pra receber o diploma. Quando eu lembro das nossas conversas 12 anos atrás, como é possível você não estar aqui? Muita coisa aconteceu nos últimos sete anos pra que isso acontecesse, mas nada teria acontecido se não fosse você. Você cresceu em condições difíceis, e nem fez nem ensino médio. Mas desde quando eu era bem nova, você sempre sempre me ensinou que eu tinha que estudar. Você queria que eu chegasse aqui onde cheguei. Quando eu tinha uns 12 anos você ouviu alguém dizer que eu tinha que aprender inglês, e todo semestre, por anos, estava você lá me matriculando, indo atrás de descontos, fazendo o possível e impossível pra que eu fizesse aquelas aulas. O mesmo com o cursinho, pra que eu pudesse ir pra uma universidade boa. Obrigada, por sua persistência, por sua noção de prioridade que sempre colocou eu e meu irmão na frente das decisões, pela forte noção de ética que eu tenho, por ter me ensinado a ser tão forte, tão forte como você. Eu cresci ouvindo sua dor de ter perdido sua mãe tão jovem, do quanto que a vida foi dura com você e seus irmãos por isso, mas sempre soube da sua força. E ela que me faz ser forte hoje, mesmo sem você, mesmo com essa saudade tão gigante. Essa força que me faz seguir sonhos, apesar de tudo, mesmo sabendo que você nunca vai saber. É tão estranho seguir a vida...tanto que eu queria que você soubesse.

Eu queria te contar que moro em outro país, que meu irmão entrou na USP, de novo. Queria te contar que já tenho quase 30 anos, mas que ainda me sinto muito nova pra ser mãe. Queria te contar que na verdade não sei se quero ser mãe. Queria te contar sobre as pessoas que meu irmão e eu nos tornamos. Queria te mostrar fotos das filhas da Jú, do Fábio, da Ká. Queria que você cortasse meus cabelos. Queria te contar que meu pai passou pela mesma coisa e também foi embora, e que nossa casa não existe mais; mas que estamos ok. Queria te contar que sempre sonho com você, e quase sempre você está cuidando do meu pai. Queria envelhecer com você. Queria te levar em Roma. Queria andar na praia, com você, meu pai, meu irmão, minha tia, e a Janaina. Queria te levar na Target. Queria que você me convencesse a ser mãe, e que estivesse aqui pra me ensinar. Queria te falar que aprendi que a gente está preparado pra quase qualquer coisa, e que você é a mãe que a gente sempre quis. Queria te falar que seu amor ainda está aqui, por todos os lados. As vezes numa musica, as vezes quando falo com meu irmão. Queria te contar que descobri que depois que a gente vai embora a gente passa a morar dentro de quem a gente ama, e depois disso, mesmo que eu more longe de todo mundo, tenho tanta gente comigo! Tenho você tão viva dentro de mim.


Hoje queria ir num parque cheio de flores (é primavera!) pra ver se te encontrava em alguma cor, algum passarinho. Mas não fui, te encontro em mim quase todo dia, no contorno das minhas mãos, num perfil diferente no espelho. As vezes escuto sua voz quando falo alguma coisa bem espontaneamente. Você vai estar em mim também quando chamarem meu nome e eu receber meu diploma este mês. Você me trouxe aqui. E vai me levar pra qualquer lugar que eu vá até o fim. Obrigada por me ensinar a maior lição da minha vida: se acostume, tudo vai mudar uma hora ou outra, mas o amor permanece pra sempre. Obrigada por nos deixar esse amor que nos protege pra sempre!

quarta-feira, 24 de dezembro de 2014

"Quero meu filho pisando firme, cantando alto, sorrindo livre..."

Tenho andado ocupada, o mestrado tem tomado meu tempo, o que é bom. Descobri que sou viciada em estar ocupada, a cabeça pensa nas coisas que tenho que fazer, à noite fica fácil dormir, a vida parece que toma um sentido. Mas mesmo assim, essa dor vazia insiste em aparecer em momentos que parecem aleatórios. Minha terapeuta me lembrou que ainda é recente a morte do meu pai. Eu sinto que tenho esse luto por anos.

Entrei de férias semana passada, morrendo de medo dos dias livres. É um saco! Está tudo bem, mas as vezes choro escovando os dentes. Não tenho depressão. Além de ser tudo recente, essa época do natal bate forte! Já faz umas semanas que tenho tentado me preparar pra o natal. Quase decidi em não ter natal, ficar em casa sozinha, fingindo ser apenas uma noite de quarta-feira. Esse é sem duvida o natal mais difícil da minha vida. Estou longe da minha familia, primeiro natal sem meu pai, lembranças dos últimos dois natais com ele doente, quando tudo que eu pensava era que aqueles eram meus últimos natais com ele.

Final de ano tem um significado forte de recomeço, e eu venho tentado pensar no que fazer para ter uma vida melhor, para me acostumar mais com essas dores, esses vazios. Já nem consigo falar com ninguém sobre isso, parece que estou presa num ciclo, eu mesma me canso. Acho que ainda estou apegada nessa dor. Parece que meus pais, principalmente meu pai, vive por meio dela. Parece que se eu não sentir mais desse jeito, estarei me despedindo dele com vontade. Não quero. Quero a lembrança dele aqui comigo todo dia, quero lembrar das palhaçadas, das confusões, dele super apegado com a família, do cuidado com os sapatos e as flores. Quero lembrar dele não se conformando de eu ter vindo pros Estados Unidos. Quero lembrar dele reclamando de NY. Quero lembrar todo dia do que eu senti quando levei ele pro hospital sabendo que ele não voltaria, quando vi nos olhos do medico que seria naquele dia. Quero me lembrar das musicas que ele cantava meio sem sentido em suas ultimas semanas. Todo dia eu lembro da sensação de desamparo de quando não senti mais seu pulso. Todo dia eu lembro da tristeza profunda de voltar pra casa dirigindo seu carro, só com meu irmão. Todo dia penso na nossa casa vazia, me culpo por não estar com meu irmão e nossos cachorrinhos. Penso todo dia, não quero esquecer. Tem sempre uns dois dias na semana que choro por um minuto, e passa. Parece que assim seguro ele aqui comigo por mais tempo.

Quase todos os dias, vendo tv, ouvindo alguém contar alguma historia sobre seus pais, penso que nao é muito justo que nao tenho a chance de ver meus pais envelhecerem, ter um porto seguro, ter filhos com avos, tê-los vendo as conquistas minhas, do meu irmão, e meus primos. As vezes me paralisa o constante remoer do que isto significa na minha vida. O tamanho dessas faltas me faz parar e pensar perplexa na tristeza disso tudo, e como foi possível acontecer.

Mas no fim, de verdade, não acho que está certo me paralisar. Não é justo com eles faze-los viver na minha dor. Meus pais ficariam muito tristes com isso. Lembro que meu pai sofria de uma certa nostalgia quando eu estava crescendo. Ele sempre remoeu a morte de uma tia muito querida, em alguns domingos de manha ele ficava ate depressivo. A morte da minha mãe, ele nunca superou, chorava igual criança mesmo depois de anos. Mas ele não gostaria que fosse assim com a gente. Minha mãe cresceu sem a mãe, e era forte. Não era de choramingar, de se colocar de vitima. Ela perdeu pessoas queridas quando eu era adolescente. Ela deveria ser meu exemplo.

Quero muito para 2015 aprender a fazer meus pais viverem nas nossas conquistas, nos dias alegres. Não honro meus pais com dor, com tristeza. A vida é um ciclo, e as vezes sinto que esqueço disso, e vivo num mundo egoista olhando para minha dor.

Natal é dificil, porque sempre foi tão familia e tão feliz. Lembro de ter um lado da minha familia reunida, presentes, decoração, comida, risadas. Para mim e meus primos tudo parecia completo, mas olhando para trás não era. Minha mãe nunca passou natal com a familia dela, meus avos com certeza sentiam falta dos irmãos, dos pais. A gente cresce, e as ausências vão aumentam. As crianças que dão a falsa impressão de completude. Era tão bom.

Um ciclo, pessoas vão, deixam um buraco sem tamanho, que vira cicatriz. Outras pessoas vem, nascem novos membros da familia. A gente transforma as dores em algo mais. Queria que fosse facil me desapegar dessa dor. Quero essa lição pra 2015.



terça-feira, 7 de outubro de 2014

Dói até nos dias felizes

Acordei super cedo, meio que atrasada e lembrei do meu sonho inteiro. Eu estava em Cruzeiro, de repente era Sao Paulo, de repente era aqui. Eu estava com meu pai, que estava doente, a barriga inchada. Mas ele estava feliz. Minha mãe tambem estava la, meio que em segundo plano, meio que cuidando dele. No sonho eu estava preocupada porque estava chegando a hora de eu ir embora, mas não podia deixar meu pai. No final, decidi ficar com ele, mas isso significava que eu iria ficar longe do meu irmão. Baguncei tudo no sonho, mas acordei pensando em como o ultimo ano do meu pai, com ele doente, foi dificil, cheio de ambiguidades, culpas, decisões. Lembrei de um dia, bem no comecinho de janeiro de 2014, quando ele teve que ir numa loja cancelar um cartao, e fui com ele. Ele já estava bem fraco, quase não andando sem ajuda. Andamos um quarteirao da loja até o carro, e encontramos por acaso uma conhecida do meu pai. Eu vi no rosto dela que ela estava chocada com a aparencia do meu pai. Acho que tudo foi só acontecendo, e não tive muito tempo de me chocar. Então as vezes, sem eu perceber, eu me choco por esses dias.

Hoje tive aula/atividades extras das 8 da manhã as 8 noite. Puxado, mas gosto muito das aulas e de tudo mais. É um desafio sempre, mas é também bom quando a gente se supera, e sai da zona de conforto. O mestrado tem sido muito bom, mesmo que puxado, me deixando sem tempo pra nada (meu contato com o Brasil diminuiu muito, simplesmente neste ano isso vai ficar comprometido).

A noite, sentei num banco, no canto da estação, para esperar meu ônibus. Não consegui controlar, só chorei. Um choro com muito sentido, mas sem forma. Parece que dentro de mim tem uma tristeza, que aparece muito espontaneamente, mesmo quando tudo está bem. Não é depressão, não estou deprimida. É como se eu me lembrasse de um filme triste e chorasse, mas o filme aconteceu comigo e minha família. Chorei de lembrar do meu pai. Doente, com tantos medos, tantas angustias, querendo a gente sempre por perto, e a gente tendo que fazer outras coisas. Chorei de lembrar de Cruzeiro, da casa vazia, meus cachorrinhos carentes, de quando tive que me despedir de tanta coisa, do meu quarto de décadas. Tantos vazios nas ruas daquela cidade. Lembrei de como me despedi do meu pai, e de como isso é só mais um pedaço das dores e saudades que não vão embora nunca.

Depois lembrei também que um dia esses vazios viram parte da gente, e não doem da mesma forma.

domingo, 10 de agosto de 2014

Esses dias de agosto...

Hoje foi dia dos pais no Brasil. A vida é estranha! Lembro-me do exato lugar em que eu estava ha exatos seis anos, dia dos pais de 2008, sem comemoração, um 10 de agosto, angustiada, cansada, sem vontade de olhar pra frente, assim como meu pai e irmão. Lembro-me também de onde eu estava cinco anos atras, ansiosa, arrumando malas, últimos detalhes, esperando com muita pressa os meses seguintes. Onde eu estava ha exatos seis meses? Ainda esta bem forte aqui, as vezes lembro daqueles dias de fevereiro, e me dou conta que a gente sempre arruma forças onde não tem. (http://esperanca-sempre.blogspot.com/2014/02/hoje-tarde.html.)

Hoje estou aqui, esperando um capitulo feliz da minha vida começar, e muito esperançosa.

Em alguns momentos dói, dificil assimilar a ausencia. Como assimilar o que nao existe? Meus primos me mandaram uma foto hoje cedo, foram no cemiterio, levaram flores no tumulo do meu pai. Eles eram como filhos dos meus pais tambem, que sempre se preocupou demais com todos os sobrinhos. Tentei esquecer na maior parte do dia todo o simbolismo deste dia. Hoje a saudade dele, que foi embora ha tao pouco tempo, dói mais. Meu pai foi um super pai, daqueles que trabalham muito pela familia, mas que tambem traz muita alegria e amor.  Terça feira faz 6 anos que minha mae foi embora. Amanha começo um desafio, que e é tambem um sonho. As vezes a vida tira muito, mas as vezes a vida dá!

Que eu e meu irmao nunca esqueçamos do orgulho que meu pai tinha da gente, muito maior do que a gente na verdade merecia. Que isso seja sempre a força que nos leva pra frente, que a gente tente ser sempre um pouquinho do que ele via de bom em nós.

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segunda-feira, 4 de agosto de 2014

Paramos nos 60, ontem seriam 61

Ontem seria aniversário do meu pai. Ele faria 61 anos. Ano passado eu nao estava la com ele, mas ele teve um aniversario especial. Ele recebeu em casa muitos amigos, que trabalharam por anos com ele. Levaram salgadinhos, bolos, refrigerante. Tiraram muitas fotos. Meu pai me contou chorando de alegria, muito feliz. Foi uma despedida.

Eu sabia que as chances de ele repetir um aniversario eram muito poucas, e ano passado escrevi este texto no facebook:


Aniversario é sobre reconhecer a dádiva de mais um ano de vida. Ano passado foi estranho. Quem tem a chance de comemorar a vida, sabendo que ela logo vai acabar?

Este ano nao teve mensagem no whatsapp, nem ligacao, nem nada. A distancia entre nós ficou muito maior, e a cada 3 de agosto, ao inves de comemorar a dadiva da vida, vamos lembrar de como fomos obrigados a parar de contar nos 60. Quanto tempo dura o resto de nossas vidas? Foram seis meses. Muito pouco tempo.

Ontem fui num parque, que estava cheio de pais e filhos. Muitos ensinando seus filhos a andar de bicicleta, outros correndo. Pensei demais no meu pai. Como ele foi um super pai!

Ele ensinou eu, meu irmão e todos meus primos a andar de bicicleta. Ele gostava demais de passear e viajar, não tinha tempo ruim. Meu aniversario é em junho, e quando eu era criança, sempre tinha uma mini festa junina. Meu pai soltava fogos, construía fogueiras, fazia a festa da criançada colocando fogo no bombril e fazendo uma chuva de faiscas.

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Um dia, quando meu irmão era bebê, meu pai teve um dia de folga e me levou pra passear. Foi uma das poucas vezes que me lembro de sairmos só eu e ele. Demos umas voltas pela vizinhanca, e chegamos na casa dos meus avos. La nós tiramos varias fotos. Eu lembro de sentir que ele tinha orgulho de mim, e eu era tao pequena!

Uma das imagens que tenho do meu pai mais novo é de quando ele ia, todo sábado de manhã, alugar fitas de video game com meu irmão.

Quando eu me fui para Sao Paulo, fazer faculdade, meu pai estranhou muito. Ele me deixou na pensao em SP, e foi embora dirigindo chorando, junto com minha tia e minha mãe. Ele sempre dizia que chorava de saudade de quando a gente era pequeno. Ele sempre me contava de como ele sentiu a primeira vez que me viu. Eu olhei pra ele, com olhos arregalados, grandes! Ele achou magico que eu, tao bebe, conseguia olhar daquele jeito pra ele, como se eu tivesse reconhecido meu pai. Foi a primeira vez que nos vimos. Entre a primeira e a ultima vez foram apenas 27 anos. Tao pouco tempo!

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Meu pai escondia frutas nas malas minhas e do meu irmão, quando a gente voltava pra SP. Ele cismava que fruta do interior era mais saudáveis. A gente não queria levar, porque pesava na mala, mas ele, teimoso, dava um jeito de esconder.

Meu pai era mestre em deixar roupas branquinhas, consertar sapatos e botas.

Ele falava bastante, e escrevia mensagens de textos gigantes também.

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Eu queria muito, muito mesmo, que os 60 anos pudessem ser 90. Mesmo que eu morasse longe, mesmo que a gente se visse poucas vezes no ano. Queria poder contar coisas pra ele, mandar fotos minhas quando maquiada ou arrumada pra sair. Queria que ele visse minhas orquideas. Queria ele aqui quando eu terminasse o mestrado, quando eu tivesse filhos, e quando meus filhos se formassem.

Quanto tempo é pouco tempo? Foi muito pouco tempo.