domingo, 12 de agosto de 2018

10 Anos Inteiros

3652 dias
521 semanas
Quase um terço da minha vida.
DEZ...ANOS...
Sem você.

E houve meses em que eu não conseguia dormir no silêncio porque eu tinha absoluta certeza que não seriam possíveis dias sem você. E hoje cá estou, uma década inteirinha depois, tocando a vida, com sonhos e planos, dormindo em paz. Uma década em que você não está em lugar algum. Desamparada, sem minha mãe, pra sempre.

E tudo que já me aconteceu se resume em antes e depois daquele 12 de agosto. Nunca mais nada foi do mesmo jeito, nem eu, nem as flores, nem os sorrisos, nem as lágrimas, nem as coxinhas, nem as lasanhas, nem os meus cortes de cabelo, nem um dia. Tudo passa pela consciência da sua ausência. Tudo de bom, e tudo de ruim. E ainda bem que são raras as noites em que você não passa pelos meus sonhos, uma voz, um olhar que seja, abraços apertados. Ainda sonho que você viajou para longe. Ou que de repente descobri que você estava este tempo todo num hospital. Uma ausência que ainda confunde meu inconsciente.

A primeira vez que senti sua ausência foi antes mesmo de você ir. Foi um dia lá daquele agosto quando me falaram que você iria embora em poucos dias. Foi a primeira vez na vida que me assustei com a dor de sentir o vazio. Com o tempo ele se fecha um pouco, como uma ferida, que se cura e deixa uma profunda cicatriz. E dói nos dias frios. E o mais estranho é que também dói nos dias de calor. Desde de sua ida eu sou feliz mesmo só nos dias mornos.

Lembro ainda dos dias de calor, de antes, de riso, de conversa, de estar na cozinha de casa, ou na sala, cenas cotidianas, ou nem tanto, de praia, de carro, de feira, de supermercado, de andar de braço dado, de contas, de planos, de orgulho. Eu sabia que eu tinha tudo. Que alegria era minha ingenuidade de não saber que eu seria como você, uma jovem adulta sem colo. E que você seria como sua mãe, uma lembrança que fica mais longe a cada dia para o mundo, embora esteja sempre tão intensa aqui em mim. Você sabia como era, você me falava como era. Eu cresci te vendo sofrer sem esse cuidado, que hoje eu sofro. Uma saudade de tudo que não virá.

Nesses 10 anos aconteceu tanto, fiz tantas escolhas, precisei tanto de você. Meu pai também se foi, e com ele levou quase tudo que restava... Dez anos... E criei uma outra vida, reaprendida, em que não há como haver almoços de família, avós, casamento. Uma vida sem rede de proteção. Não tem lado nenhum pra cair. Não tem um número que eu posso ligar a qualquer momento por qualquer razão. Não tem aquele amor. Um desamparo do caramba. Há um tempo eu escolhi aceitar. Não há outra escolha possível. A gente segue.

Essa década me ensinou muito. A maior lição talvez tenha sido que de tudo, tudo mesmo, só permanece a morte e o amor, o resto, todo o resto, im-permanece. Tem sido assim, 3652 dias de im-permanências e permanências, de dias de sol, de chuva, de nuvens, de ventos leves, de furacões, dias de muitos sorrisos em que agradeço por ainda ser feliz e por ainda sentir este amor, e dias de muito pesar em que não me conecto com o mundo e escolho estar apenas comigo. Vejo beleza em todos eles, aprendo com todos eles.

Uma década inteira, em que muitas vezes lembrei apenas dos seus últimos dias, tão intensos. Mas quero lembrar e agradecer sempre por todos os 8104 dias - 22 anos, 2 meses, 7 dias - em que compartilhei a vida com você, vida que você me deu.


quinta-feira, 9 de agosto de 2018

Agosto Parte 1: 65 anos do meu Pai


O video que menos se parece com ele. Mico? Ele não tinha noção de mico não haha Ele estava só mesmo tentando copiar eu e meu irmão que repetimos "mico" nessa viagem o tempo todo. Ele falava com todos, pedia informação para todos, falava portugues com quem não entendia nada. Eu fiquei brava algumas vezes, mas hoje só lembro de tudo com muita alegria e saudade que aquece o coração. Meu pai era uma figura, ele era muito único. Ele era tímido, mas ás vezes não ligava de chamar atenção. Inteligente pra caramba, mas às vezes ainda ingênuo. Não tinha nunca tempo ruim pra palhaçada, viagens, inventação de moda. Nervoso, impaciente, agitado, não dormia muito, gostava muito de tv, de falar, que todo mundo assistisse as mesmas coisas, e soubesse das mesmas histórias. De plantinhas. De comprar fruta na feira, e escolher bem escolhida. Eu ficava ás vezes brava com as insistências. Ele ficava bravo com as ausências. Esse era meu pai, um pai tão pai, que hoje faria 65.

3 de Agosto de 2018

terça-feira, 26 de junho de 2018

Inteira e forte

Meus amores eternos
(Teresa Gouvea)

"Carrego meus mortos no coração, alheia aos ouvidos que não suportam a honra que cabe nessa escolha. Andam comigo nos meus gestos, nos sabores que reconheço, nas fotografias que contam nossas histórias e nas várias partes que compõem quem me tornei. Sabedora dessa honra dou permissão para que vivam através da minha fala e da minha saudade, não me incomodam ou fragilizam, ao contrário, me tornam inteira e forte". (Teresa Gouvea)

https://m.facebook.com/story.php?story_fbid=996158513885612&id=102570029911136



segunda-feira, 4 de junho de 2018

32 obrigadas!

Assopro as velhinhas e não peço nada. Apenas digo obrigada!

Pela fresta de sol que quebra o ar frio
Pelo café quente das manhãs de sábado
Pelos aviões
Pela vontade de acordar
Pelas verdades da vida que me fizeram forte
Pela vontade de aprender, que é tão constante e tão aleatória
Por todos os minutos de silêncio
Pelos amigos que insistem em ser amigos com tantas distâncias
Pelos conformismos necessários
Por todas as montanhas que já vi e verei na vida, as verdinhas, as branquinhas, e as vermelhas
Pelos renascimentos de cada ano com a primavera
Por ser tão fácil achar pão, em qualquer lugar do mundo
Por tudo que não vai embora com o final da vida
Pelo riso sem razão
Por um marido que cozinha, lava, e limpa a casa
Pelos cachorrinhos
Pelas lentes de contato
Por uma sogra bem pra frente
Pela memória ruim
Por ter tudo que eu preciso
Pela água quente e gelada, no momento certo
Por alguém aceitar me pagar para fazer o que eu gosto
Pela Internet e todas as formas de comunição instantânea que vem com ela
Pelos genes que não herdei
Pelo lar em que cresci
Por meu irmão
Pelas praias de água quente
Pelos aprendizados que vem com as ruguinhas
Por gostar tanto da minha própria companhia
Por meus tios, tias, primos, e primas, todos
Pela certeza que medimos a vida com nossas próprias medidas
Por ainda haver sentido
Agradeço







sábado, 3 de março de 2018

sábado, 27 de janeiro de 2018

A ordem certa dos dias


Já fui triste. De chorar e doer, como um buraco bem no meio do peito. De nem conseguir mais chorar, o que é a pior forma de tristeza: não tem como desembocar em rios; acumula, pesa, e afoga. Esqueci minha saúde, meu teto, minha comida na mesa. Não pensei em quem não dorme com medo de morrer sem perceber, ou de ladrão. Talvez seja a lua que mudou. A escuridão ás 5 da tarde. O desamparo de não ter ninho. Os seguidos finais de semana em silêncio. A constatação que no final estamos mesmo é sozinhos. O vento frio. O mau humor dos motoristas. As tantas pessoas formiguinhas, assim como eu.

Já fui feliz. De acordar sorrindo nos dias em que nada me esperava a não ser 8 horas sentada numa mesa. De falar sem parar, e sorrir para estranhos, e balançar a perna ouvindo rádio. Esqueci dos buracos, das distância. Fingi que sou preenchida, de tanto sentido, que transborda. Talvez seja a lua que mudou. Talvez seja a constatação que não importa o que eu sinta, contanto que eu dê nomes a eles. Os seguidos finais de semana com o silêncio, um dos meus amigos preferidos. E os poucos amigos que são minha rede. Talvez seja ouvir uma voz, ou descer do avião. Sentir o sol no rosto e fechar os olhos. A música que fala com você. Sentir minha humanidade em comum com quem nasceu do outro lado do planeta. Dar passagem na rua, e oferecer o lugar.

Um vai e vem. Talvez seja o começo da estação que eu gosto. E depois o fim. Talvez sejam as horas de sono, vai saber. Talvez sejam todas as fotos que tirei ano passado, e o que só fica em foto. Ou o que só importa agora, e nem vai mais existir daqui 50 anos. Talvez seja o café. Talvez seja o agora. Ou os dias em que há mais futuro que qualquer presente. Do passado nem ligo; minha memória deixa tudo escondido. Amém.

Todo mundo quer ser feliz. Mas a gente prega peças. A gente não se deixa ser feliz, porque felicidade é um negócio custoso. Carregar um sorrisão num mundo tão capenga parece um desatino. Como vou ser feliz se falta tanto? Tanto em mim, tanto no mundo, tanto no sentido das coisas. Como ser feliz se há tanto no que não me tornei? Tanto nas conversas que nunca vou ter. Tanto na forma como não deixo as pessoas verem o quanto me importo. Custa calar essas conversas internas. Custa ignorar que o mundo está falhando. Custa parar e estar agora.

Vamos lá, um dia por vez!

Só hoje me permito ser feliz ou triste, do jeito que venha.
Me permito ser o que eu sou
Mesmo que não seja o suficiente
Mesmo que não tenha feito nada para merecer nem a luz nem a escuridão.
Serei o que o dia me reserva.
Sem alterar a ordem das coisas, nem dos dias, nem dos sentidos.
E que haja sempre a certeza que quase tudo passa.
Os dias bons e os ruins.
E que ja aprendi a lição da única coisa que não passa.
Que o universo continue pulsando, na velocidade e tempo certos.

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"O correr da vida embrulha tudo,
a vida é assim: esquenta e esfria,
aperta e daí afrouxa,
sossega e depois desinquieta.
O que ela quer da gente é coragem.
O que Deus quer é ver a gente
aprendendo a ser capaz
de ficar alegre a mais,
no meio da alegria,
e inda mais alegre
ainda no meio da tristeza!

A vida inventa!
A gente principia as coisas,
no não saber por que,
e desde aí perde o poder de continuação
porque a vida é mutirão de todos,
por todos remexida e temperada.
O mais importante e bonito, do mundo, é isto:
que as pessoas não estão sempre iguais,
ainda não foram terminadas,
mas que elas vão sempre mudando.
Afinam ou desafinam. Verdade maior.
Viver é muito perigoso; e não é não.
Nem sei explicar estas coisas.
Um sentir é o do sentente, mas outro é do sentidor."

Guimarães Rosa - "Grande sertão Veredas"