Houve uma época em que natal era meu dia favorito do ano. Eu contava os meses no calendário! E demorava! Novembro passava devagar. Dezembro começava com os dias arrastando. Montávamos a árvore de natal, a mesma e única que sempre tivemos. Tirávamos da caixa em cima do armário um Papai Noel que com pilha andava sacudindo o sininho. Comprávamos roupa nova, e passávamos a noite geralmente com a família do meu pai, na casa da sua irmã, minha tia Valéria. E era mágico, porque éramos criança. E éramos muitos. Seis netos da dona Gilda, e sete netos da dona Alaíde. Onze. E família por família ia chegando, dando oi, sentando. Teve um ano que tinha até Papai Noel. Teve ano que teve karaoke. Teve ano que todo mundo pulou na piscina. E todo ano a meia noite a gente fazia uma oração, pedindo que no próximo todos estivéssemos ali. E a gente comia, e abria os presentes. Mais tarde, tinha o amigo invisível, que era na verdade minha parte favorita. Era risada que doía a barriga.
E foi assim. Anos após anos. Os onze foram crescendo, e o tempo acelerando, e o natal foi chegando mais rápido. E com o tempo fomos iludidos: mais de uma década, e a cada ano a oração era atendida. Minha tia mudou de cidade, mas continuou com a festa. E estávamos todos ali. E seguíamos.
E foi assim...até 2008, quando faltou. Faltou minha mãe. E aquele natal não existiu. E foram mais três natais em que eu passei fora do Brasil. E em 2012 estava animada para passar com a família, quando dias antes do natal, meu pai descobriu que estava doente, e a noite teve um nó na garganta, porque eu achei que seria o ultimo natal do meu pai. Mas não foi. Foi em 2013, seu último natal. E em 2014, eu não passei com minha família por conta do mestrado. E não estavam la nem meu pai, nem o seu Dorival, marido da dona Alaide. E as duas famílias se reuniram, já em pedaços. E em 2015 eu estava lá, e faltou meu avô Luiz.
E minha tia, com lágrimas nos olhos, na oração, pediu - dessa vez, quase implorou - que no próximo natal estivéssemos todos ali. Ela tinha medo, porque seu filho mais novo, o Lê, estava ali, animado, mas carequinha, por conta da quimioterapia. E tiramos umas fotos repetindo poses antigas, uma de 1989! E foi um natal feliz, que vou guardar para sempre comigo.
E hoje, no natal de 2016, eu aqui, longe, só penso em como aquele dia ano passado virou mais uma lembrança boa, que se junta àqueles natais, de luz, risadas, gargalhadas, infância. Hoje não há alegria, mas há luz. Hoje lembramos dos que foram antes de nós. E da bênção que foi a família estar sempre junto por tanto tempo. Talvez há árvores, abraços, orações, pedidos de conforto. Eu espero ano que vem estar com minha família.
Que hoje haja esperança. Se o sentido do Natal era antes o riso das crianças, que hoje a esperança esteja nas lembranças, na certeza que se há dor é porque há amor. E muito. E ele nos cura, e nos leva pra frente.
Muita luz e paz para todos.
sábado, 24 de dezembro de 2016
quinta-feira, 15 de dezembro de 2016
sexta-feira, 9 de dezembro de 2016
Receita de família
Pega todas as ambiguidades da vida. Junta com crianças que são sempre crianças mesmo com 60 anos, e pega dependência, e pega ciúmes, e pega controle, e pega cobrancas, e pega amor. E coloca aí ter um ser que cresce dentro de outro. E tanto amor que não cabe numa pessoa. E mistura tudo isso num contínuo de tempo que de tão velho, não tem começo nem fim: são gerações e gerações. E tudo é quase que um jogo de sorte: quem nasceu primeiro, quem precisou mais da mãe, quem nasceu na época das vacas gordas ou magras; não faz muito sentido quem vai ser o que, quem vai ser vilão, quem vai ser mocinho. Uma mistureba só!
E adiciona aos poucos novos membros, que vem de outras famílias, carregando suas próprias bagagens, que ocupam papéis novos: talvez noras nem tão queridas, genros não preferidos, e sogros e sogras, e afilhados, e divórcios, e segundos casamentos, e segundo genros e noras. E todas as relações se misturam, se entrelaçam, de década em década. Com tantas mudanças no mundo. Com individuos tentando ser gente, cada um de uma forma, cada um dando valor diferente ao tempo, ao dinheiro, á carreira. Traumas são repassados, ou não. Curas acontecem, ou não. Alguns se desprendem de ciclos doentios, e criam do nada ciclos tão saudáveis que parecem até de mentira.
E acrescenta ainda heranças, e genética, e mudanças, e distâncias. E saúde, e perdas gigantescas, e envelhecer, e todos os obstáculos da vida. E todos os sentimentos que são tão claros de se ler, e um tantão de outros que só sabe mesmo quem sente. E joga um bocado de culpa, remorso, churrascos, obrigações, preferências, risos, sopa quente, cemitérios, igrejas. Quem era cuidado vira cuidador. Nomes. Laços tão fortes que causam danos e curas irreparáveis. Te fazem chorar igual criança mesmo já sendo marmanjão. E também dão sentido pra vida. Qualquer família nesse mundo dá um livro, drama, romance, intriga, mistério, comédia.
E adiciona aos poucos novos membros, que vem de outras famílias, carregando suas próprias bagagens, que ocupam papéis novos: talvez noras nem tão queridas, genros não preferidos, e sogros e sogras, e afilhados, e divórcios, e segundos casamentos, e segundo genros e noras. E todas as relações se misturam, se entrelaçam, de década em década. Com tantas mudanças no mundo. Com individuos tentando ser gente, cada um de uma forma, cada um dando valor diferente ao tempo, ao dinheiro, á carreira. Traumas são repassados, ou não. Curas acontecem, ou não. Alguns se desprendem de ciclos doentios, e criam do nada ciclos tão saudáveis que parecem até de mentira.
E acrescenta ainda heranças, e genética, e mudanças, e distâncias. E saúde, e perdas gigantescas, e envelhecer, e todos os obstáculos da vida. E todos os sentimentos que são tão claros de se ler, e um tantão de outros que só sabe mesmo quem sente. E joga um bocado de culpa, remorso, churrascos, obrigações, preferências, risos, sopa quente, cemitérios, igrejas. Quem era cuidado vira cuidador. Nomes. Laços tão fortes que causam danos e curas irreparáveis. Te fazem chorar igual criança mesmo já sendo marmanjão. E também dão sentido pra vida. Qualquer família nesse mundo dá um livro, drama, romance, intriga, mistério, comédia.
E mesmo com todas as ambiguidades, com guerras e amores, ainda assim sempre se quer o bem. Porque família é quem divide com você o passado, desde seu abrir dos olhos. Quem viu você crescer, quem conheceu sua bisavó e sua mãe. Quem você viu engatinhar, e vê se formando na faculdade. Quem era crianca com você. São aquelas histórias que não importa a distância estarão sempre misturadas na sua. Quem vai dividir com você as melhores festas e as piores dores, não por empatia, mas sim porque são também as festas e dores deles. Vão te chatear, e vai parecer que não gostam de você, ou que não se importam, ou que você não se importa. Mas sabe? Há amor. Mesmo que na intensidade haja sofrer, vale a pena o esforço de quebrar os ciclos de erros e rancores que se repetem geração após geração. Vale o esforço de aceitar quem é tão diferente, mas tão parte de você. Vale também você poder ser você, com qualquer defeito ou qualidade. Com suas escolhas sérias ou inconsequentes que deixariam seu avô de cabelo em pé. Ou escolher outra religião, ou escolher ser único. Não importa. Mesmo quem tenta correr. Mesmo quando te fazem correr. Há amor, ás vezes disfarçado de qualquer outra coisa. Há amor. Quebre os ciclos apenas, porque os laços, esses aí não dá não, pode tentar, pode se esforçar: os laços não se quebram.
"No one fights dirtier or more brutally than blood; only family knows it’s own weaknesses, the exact placement of the heart. The tragedy is that one can still live with the force of hatred, feel infuriated that once you are born to another, that kinship lasts through life and death, immutable, unchanging, no matter how great the misdeed or betrayal. Blood cannot be denied, and perhaps that’s why we fight tooth and claw, because we cannot—being only human—put asunder what God has joined together." -Whitney Otto
8 de dezembro, dia da familia
terça-feira, 29 de novembro de 2016
Abestalhada (em dois atos)
Setembro 15, 2016 / Novembro 29, 2016
Dá um medo do caramba. E uma tristeza, e um choque. Dias que te lembram, as vezes em rede nacional, que a vida é assim, frágil, rápida. Piscou, acabou. Mesmo no auge, mesmo num mergulho feliz no rio, mesmo a caminho do seu maior sonho. Acabou. E não é assim com todo mundo? Não é esse o fim, não importa nada mais? Hoje vi esse texto, tão lindo, falou comigo:
"Se você não se sente profundamente tocado pelo vislumbre da morte, é porque não olhou de perto. A consciência clara da mortalidade, nossa e dos outros, produz um impacto poderoso em nossa vida, muda drasticamente a relação que temos com as pessoas, com nossas ocupações, com nossas aspirações pro futuro, com as prioridades, com o tempo." —Fábio Rodrigues, na prática "Lembrar da morte".
E lembrei das vezes que olhei a morte de perto. E pensei: será que aprendemos as liçōes da morte? Quando o vislumbre da morte ensina? E quando paralisa? Olhar de perto é ver o fim, é ver a gota de vida indo embora de alguém que é não apenas um ser humano, com história, com sonhos, mas um ser para quem demos uma parte de nós com formas mais puras de amor. Pedacinhos de nós, que se vão, e pronto: quem sou eu? Como fazer disso tudo lição, e não apenas dor?
Pra que planos? Pra que guardar dinheiro? Pra que ter agenda? Para que fingir controle? Para aproveitar mais a vida! Essas consciências deveriam nos fazer mais vivos, mais aproveitadores não só das tardes de sábado, mas também das 10:20 das manhãs de terça. Ser feliz, na intensidade do agora. E isso está bem longe da ideia de sair por ai, esquecer as contas, e comprar cerveja. Viver o hoje, com toda a responsabilidade, pois ela também traz paz. Escrevendo o TCC e não pode mais ver os amigos? Escreva com intensidade, aprenda tudo, faça cada linha da escrita um pequeno tesouro, se doe ao trabalho. Não espere ter dinheiro, ter tempo, estar morando num lugar perfeito, ou trabalhando num lugar perfeito. Voce tem muito mais poder sobre os dias, mesmo aqueles mais sem graça, de alarme, transito, cadeira, reunião, cadeira, transito, tv. Não é bem o que voce faz, mas como. Não se contente com um dia sem sentido. Seja o sentido repleto de profunda dor, saudade, amor, paz, calma, beleza, poesia, ou alegria.
Setembro 15, 2016
To aqui. Abestalhada. Indignada. Maravilhada. Sentada no sofá, sem sono. Pensando na raridade da vida, que a gente toma como certa. Errado! Menino, as pessoas vão embora. E não importa o quanto você os ame, o quanto voce precise deles, o quanto de você é feito deles. Eles vão. Ou vai você. E beira o desespero ne? Que grande merda isso. É caso pra desistência, pra depressão, pra parar tudo e querer descer. Pra que tudo isso então? Pra que pagar conta, ter agenda, ir ao medico, não comer coxinha, beber menos? Pra que? Entre o desespero e a lição, pegue a lição. O tempo é curto, faça o que for, seja feliz! Não se deixe preocupar com esse fim certo. É certo, e ponto. Não se preocupe hoje, não se abestalhe no sofá. Viva o que vale, o hoje e só.
Dá um medo do caramba. E uma tristeza, e um choque. Dias que te lembram, as vezes em rede nacional, que a vida é assim, frágil, rápida. Piscou, acabou. Mesmo no auge, mesmo num mergulho feliz no rio, mesmo a caminho do seu maior sonho. Acabou. E não é assim com todo mundo? Não é esse o fim, não importa nada mais? Hoje vi esse texto, tão lindo, falou comigo:
"Se você não se sente profundamente tocado pelo vislumbre da morte, é porque não olhou de perto. A consciência clara da mortalidade, nossa e dos outros, produz um impacto poderoso em nossa vida, muda drasticamente a relação que temos com as pessoas, com nossas ocupações, com nossas aspirações pro futuro, com as prioridades, com o tempo." —Fábio Rodrigues, na prática "Lembrar da morte".
E lembrei das vezes que olhei a morte de perto. E pensei: será que aprendemos as liçōes da morte? Quando o vislumbre da morte ensina? E quando paralisa? Olhar de perto é ver o fim, é ver a gota de vida indo embora de alguém que é não apenas um ser humano, com história, com sonhos, mas um ser para quem demos uma parte de nós com formas mais puras de amor. Pedacinhos de nós, que se vão, e pronto: quem sou eu? Como fazer disso tudo lição, e não apenas dor?
Pra que planos? Pra que guardar dinheiro? Pra que ter agenda? Para que fingir controle? Para aproveitar mais a vida! Essas consciências deveriam nos fazer mais vivos, mais aproveitadores não só das tardes de sábado, mas também das 10:20 das manhãs de terça. Ser feliz, na intensidade do agora. E isso está bem longe da ideia de sair por ai, esquecer as contas, e comprar cerveja. Viver o hoje, com toda a responsabilidade, pois ela também traz paz. Escrevendo o TCC e não pode mais ver os amigos? Escreva com intensidade, aprenda tudo, faça cada linha da escrita um pequeno tesouro, se doe ao trabalho. Não espere ter dinheiro, ter tempo, estar morando num lugar perfeito, ou trabalhando num lugar perfeito. Voce tem muito mais poder sobre os dias, mesmo aqueles mais sem graça, de alarme, transito, cadeira, reunião, cadeira, transito, tv. Não é bem o que voce faz, mas como. Não se contente com um dia sem sentido. Seja o sentido repleto de profunda dor, saudade, amor, paz, calma, beleza, poesia, ou alegria.
"Senhoras e senhores, trago boas novas: Eu vi a cara da morte e ela estava viva" Cazuza
Setembro 15, 2016
To aqui. Abestalhada. Indignada. Maravilhada. Sentada no sofá, sem sono. Pensando na raridade da vida, que a gente toma como certa. Errado! Menino, as pessoas vão embora. E não importa o quanto você os ame, o quanto voce precise deles, o quanto de você é feito deles. Eles vão. Ou vai você. E beira o desespero ne? Que grande merda isso. É caso pra desistência, pra depressão, pra parar tudo e querer descer. Pra que tudo isso então? Pra que pagar conta, ter agenda, ir ao medico, não comer coxinha, beber menos? Pra que? Entre o desespero e a lição, pegue a lição. O tempo é curto, faça o que for, seja feliz! Não se deixe preocupar com esse fim certo. É certo, e ponto. Não se preocupe hoje, não se abestalhe no sofá. Viva o que vale, o hoje e só.
segunda-feira, 28 de novembro de 2016
Encucação
Todo dia é assim, a todo momento, pensamentos passam com palavras tortas, as vezes fortes, as vezes leves, na nossa frente. Alguns caem no chão bem rápido, outros ficam flutuando por um instante de vida. Alguns tão bons, confortantes, te fazem rir. Outros, de tão medonhos te fazem fechar os olhos, mas mesmo assim, voce os vê. Eles todos passam, sem parar. Uma constante brisa, as vezes vento, as vezes furacão. Até que... de repente, vão chegando bem pertinho, dão voltas, encostam na testa, e boom! Encuca.
Encucação: condição em que o portador faz cativo um pensamento. Aguda, ou crônica. Ainda não se sabe o tratamento.
Tem gente que nunca encuca, são resistentes desde criança. Talvez genética, vai saber. Deixam pensamento ir, vir, voltar, dançar, pular, fugir. Tem gente que encuca só de tempos em tempos, e consegue desencucar só de fechar os olhos. Dura 37 segundos. Tem gente que encuca todo dia e precisa de doses diárias de ar, árvores, e céu. E ainda assim, não há cura. Desapercebidamente afeiçoa-se de um pensamento, mesmo que feio, mesmo que triste. E segura o pensamento como doce, não deixa escapar. E olha, e escuta, e cheira, e investiga de todos os lados. E o pensamento que nem é bobo nem nada, aproveita, e se deixar encucar. Pensamento só gosta quando está na cabeça. E martela, e queima, esfria. Investiga-se como se a vida dependesse daquele pensar. Encucação parece bonito, disfarca-se de cuidado, mas não é bom nem pra tosse. Pensamentos devem ir e vir.
Para lembrança podem ser escritos, desenhados, twittados. Mas nunca encucados! Como desencucar, minha gente?
terça-feira, 15 de novembro de 2016
O peso do mundo agigantado
E veio assim, de repente, ás 4:32 da tarde, quando já era noite: um agigantamento do mundo. De tão grande, não conseguiu andar, os passos eram tão pequenos. E chovia, e o guarda-chuva se contorcia, e as botinhas de chuva não davam conta da tempestade. Foi chuva como não se via há tanto tempo. E no chão estavam reflexos de verde, e amarelo, e vermelho, e verde de novo. E todo mundo esperava, seguindo a ordem das coisas. Dorme, trabalha, come, dorme. E os passos ja tão pequenos, ficaram mais lentos, pois o mundo agigantado era carregado nos ombros. Que peso. Foi preciso deitar. E chorar, de dor. Porque doía. Precisou de gelo, e sopa, e silêncio. E lembrou de como é boa a solidão, cheia de conversas internas. Diferente não pode ser. Aumentaram-se as distâncias, para chegar na padaria, no amigo, no vizinho. De tão longe ninguém nem mais via ninguém. Quanta neblina! Perdeu os óculos. E teve, por um segundo, uma lembrança em forma de sombra, fria e cortante: "minha mãe não tem telefone" - a pior forma de se estar sozinho no mundo gigante. Que de tão gigante em distância, escolheu-se no tempo, e virou quase nada. Em 100 anos vai ser tudo areia. E contentou-se em dormir, e esperar um novo dia. Que dia o sol se pōe as 7:15?
PS. Mais uma pequena coincidencia desse mundo misterioso. Fui olhar, "por acaso", aqui o sol vai se por as 7:15 em 4 de abril. Presente da/para minha mãe, que nao tem telefone mas sempre encontra outras formas
PS. Mais uma pequena coincidencia desse mundo misterioso. Fui olhar, "por acaso", aqui o sol vai se por as 7:15 em 4 de abril. Presente da/para minha mãe, que nao tem telefone mas sempre encontra outras formas
sexta-feira, 12 de agosto de 2016
8 e ∞
E 8 anos depois
Ainda
Entre momentos banais do cotidiano
Entre dois degraus que subo no metro,
logo depois de tirar os sapatos ao entrar em casa,
ou entre fechar os olhos e o sono vir
Tenho 3 segundos de espanto
Quase perco o ar, pulo duas batidas
E vem um mistério
Que de tão grande não se faz em pensamento
Não cabe no pensar, cabe só no sentir.
Eu sinto:
Como minha vida existe sem você?
E tomo o terceiro degrau.
E sonho.
Ou sento no sofa.
E sigo
Cheia de desamparo e coragem.
Ainda
Entre momentos banais do cotidiano
Entre dois degraus que subo no metro,
logo depois de tirar os sapatos ao entrar em casa,
ou entre fechar os olhos e o sono vir
Tenho 3 segundos de espanto
Quase perco o ar, pulo duas batidas
E vem um mistério
Que de tão grande não se faz em pensamento
Não cabe no pensar, cabe só no sentir.
Eu sinto:
Como minha vida existe sem você?
E tomo o terceiro degrau.
E sonho.
Ou sento no sofa.
E sigo
Cheia de desamparo e coragem.
sexta-feira, 22 de julho de 2016
Viaje bem ai no alto
(Para o Lê)
Vai lá viajar pelo mar, pelo rio, pelas pedras da pedreira, pela areia da Vermelhinha, pelo céu tão azul quanto seus olhos. Vai se misturar com as nuvens, com os beijos de chegada e despedida, com as manhãs preguiçosas. Viaje pelo Itaquera, bem no meio da torcida. Vai lá ser parte das conversas mais felizes dos seus amigos, das maiores zueiras, de todos os casamentos, todas as festas. Viaje feliz por ter sido a maior lição da vida de tanta gente, sobre o que é importante, o simples dessa vida curta que traz felicidade: amigos, rio e mar. Lição sobre o que não importa, sobre o que é temporário: as vaidades, as manias, as conversas sem sentido. Lição que dar as mãos e olhar com carinho cura dores físicas. Que um filho nunca cresce, e quer a mãe e o pai por perto o tempo todo. Que tem amigo mais chegado que irmão, e tem irmão tão chegado que é quase metade de nós mesmos.
Vai lá viajar pelo mar, pelo rio, pelas pedras da pedreira, pela areia da Vermelhinha, pelo céu tão azul quanto seus olhos. Vai se misturar com as nuvens, com os beijos de chegada e despedida, com as manhãs preguiçosas. Viaje pelo Itaquera, bem no meio da torcida. Vai lá ser parte das conversas mais felizes dos seus amigos, das maiores zueiras, de todos os casamentos, todas as festas. Viaje feliz por ter sido a maior lição da vida de tanta gente, sobre o que é importante, o simples dessa vida curta que traz felicidade: amigos, rio e mar. Lição sobre o que não importa, sobre o que é temporário: as vaidades, as manias, as conversas sem sentido. Lição que dar as mãos e olhar com carinho cura dores físicas. Que um filho nunca cresce, e quer a mãe e o pai por perto o tempo todo. Que tem amigo mais chegado que irmão, e tem irmão tão chegado que é quase metade de nós mesmos.
Viaje
bem ai no alto, sem cinto, sem preocupação. Deixe todas as dores e angustias do
seus últimos meses pra trás. Eu sei que você queria mais tempo, foi pouco, tão
pouco. Queria mais jogos de tênis, mais corridas em Cruzeiro, mais idas a
Ubatuba, mais tardes com a Sara, mais dias, mais anos, muitos anos. Você queria
aproveitar cada minuto, eu sei. Parece que você até sabia, porque sempre viveu assim,
fazendo o que gostava. Que bom!
Viaja
bem, e não se chateie se um dia parecer que estamos tão triste. Aqui ficou um
buraco, que não se fecha, pois é feito de matéria infinita: saudade e amor. É
que vamos sentir tanto a sua falta! Do seu jeito de andar, a forma como chamava
seu irmão, sua voz de descontentamento quando ficava frustrado, seu riso tão
largo que fazia seus olhos ficarem pequenininhos! Queríamos ver tantos dos seus
dias mais felizes! Mas fique tranquilo, que sabemos que o sonho que tínhamos
para você, agora é o sonho que você tem para nós: vamos sobreviver. Com este
amor e com essa vontade de vida que você deixou. Hoje seguimos num mundo quase novo,
uma nova vida, com menos risos, e mais coragem. Você nos ensinou que somos tão
fortes, capazes de suportar o inimaginável. Guerreiros como você.
Viaje
em paz, porque aqui você cumpriu sua missão de tornar as pessoas melhores, que não
desperdiçam os dias, que sabem que quando a fé e a esperança parecem acabar, o
amor sobrevive, forte, gigante, cruzando o caminho entre os mundos. Va em paz,
que esse amor será nossa força, todos os minutos, até o dia lá na frente, nem tão
longe assim, quando nos encontraremos. Voaremos juntos, do seu lado novamente, e você nos
contará tudo que aprendeu, e todos os segredos, e todos os porquês que hoje não
entendemos. E naquele dia seremos todos lembranças, ligados por laços feitos
somente de amor, dor, e saudade.
Foto de hoje a tarde, 22 de julho
quarta-feira, 20 de julho de 2016
1988
Seis netos, dois de cada filho. Filhos do Valdir, Valter, e Valéria. Netos da Gilda e do Luiz. Uma família "intensa", vamos dizer assim. Com mães super mães, que fazem o possível e impossível pros filhos, mas que também cobram. Família ciumenta, falante.
Os filhos casaram todos em um ano, e os primeiros netos foram chegando assim, um atras do outro: novembro de 1985, maio de 1986, e junho de 1986. Menos de 2 anos depois, veio a segunda leva: janeiro de 1988, janeiro de 1989, julho de 1991.
Fizeram muitas coisas juntos: natais, aniversários, festas, brincadeiras, dormir um na casa do outro, aprender a andar de bicicleta, pular fogueira, brigar, brincar, brincar na piscina, passar ferias na praia em casas que acabavam superlotadas. Uma pequena grande confusão. Fogos no bombril. Andar em Ubatuba fingindo bater a cabeça no orelhão. Dinheiro no sabão. Tudo foi bem, muito bem. Quando tudo vai bem, as vezes a gente se esquece que a regra não é essa.
2008
E começou com a mulher do Valdir, nora da Gilda, cunhada da Valéria. Foi cancer, foi um susto, foi rápido. As coisas mudaram. Foi a perda, e foi também o tempo passando. Os netos crescendo. As vezes é dificil criar asas, difícil ver os filhos criando asas. Cada um criou asas da sua forma.
2014
Um tempo depois, foi o Valdir. Cancer, de novo. Batalha perdida. No mesmo ano, a Valeria perdeu o sogro. Um senhor tao forte, vivo, saudável, falante, engraçado. Foi cancer, foi rápido.
2015
Um ano e meio depois, foi embora o vô Luiz, dessa vez foi a idade, era sua hora. Ficou pouco não resolvido, pouco não vivido. No mesmo ano, o Valter também perdeu o sogro. Também de idade, um senhorzinho que até o ultimo segundo sabia de tudo que acontecia, não perdeu a noção do mundo, nem por um minuto.
Em 2016, foi ontem, foi o Leandro, filho da Valéria, meu primo. O quarto neto, 28 anos. Quanta vida, quantos sonhos, quantos dias felizes. Neto que mais soube aproveitar a vida, que mais se divertia. Talvez o que menos se preocupava com o futuro, que bom. O mais bonito. Corinthiano. Batalhou por pouco mais de 1 ano. Foi cancer, foi rapido. Batalhou tantas quimios, cirurgias, prognosticos ruins, a angustia, dores, mal estar. E lutou com ele seus pais, seu irmao, sua namorada, tantos amigos. Como tinha amigos! Amigos da hora da bagunça, amigos da hora da dor. Não pude me despedir (essa ideia que eu tive que morar longe...).
O pai dele foi quem dirigiu meu pai de volta de Sao Paulo a Cruzeiro quando minha mãe se foi. Depois, repetiu comigo, quando foi a vez do meu pai. Eu sinto uma dor de pensar que em menos de três anos, seria com ele, com um filho. Dor que esta longe do meu entendimento.
Lê, voce deixa um vazio que se junta a tudo da minha infância que ja foi embora. Seu jeitinho de andar, seu jeito de chamar seu irmão, sua voz de descontentamento quando ficava frustrado, as caronas muitas que peguei pra SP. No Natal te vi tao bem, carequinha, mas forte, brincando. Achei que tudo iria terminar bem. Me disse que tinha que vir conhecer "essa Boston ai", queria ver jogo do Tom Brady. Te falei que da próxima te levava uma camiseta. Sinto não ter tido tempo, sinto não poder ver seu filho de olhos azuis. Sinto tanto, e ate agora não sei como isso pode ter acontecido.
Mas acima de tudo sinto pela sua familia, esses que estavam com voce nas noites de dor e angustia, que fizeram tudo por voce. Que pararam a vida, que nao pouparam dinheiro, nem tempo, nem idas e vindas, nada, nada. Eles nao desistiram da cura. Hoje meu maior pedido é que seus pais achem novamente o animo, a alegria de dias simples. Que a lembranca sua seja o amor, que nao acaba, que é sim mais forte que a fé e esperança, porque elas acabam, quando o que resta é o amor. Que eles encontrem sentido nessa dor, que a tomem pra eles, que a carreguem e a controlem todos os dias, para que ela nao os paralizem, mas que os facam seguir em frente por voce. Que o sonho que eles tinham para voce, seja agora o sonho que voce tinha para eles: que eles sobrevivam. É uma tarefa dura, tarefa de uma vida inteira.
E que venha logo a cura, por vocês todos. Cansamos tanto. Que todos nós, 5 netos, 2 filhos, genro e nora da dona Gilda estejamos aqui para ver. E vamos suspirar, com alivio e saudade.
Os filhos casaram todos em um ano, e os primeiros netos foram chegando assim, um atras do outro: novembro de 1985, maio de 1986, e junho de 1986. Menos de 2 anos depois, veio a segunda leva: janeiro de 1988, janeiro de 1989, julho de 1991.
Fizeram muitas coisas juntos: natais, aniversários, festas, brincadeiras, dormir um na casa do outro, aprender a andar de bicicleta, pular fogueira, brigar, brincar, brincar na piscina, passar ferias na praia em casas que acabavam superlotadas. Uma pequena grande confusão. Fogos no bombril. Andar em Ubatuba fingindo bater a cabeça no orelhão. Dinheiro no sabão. Tudo foi bem, muito bem. Quando tudo vai bem, as vezes a gente se esquece que a regra não é essa.
2008
E começou com a mulher do Valdir, nora da Gilda, cunhada da Valéria. Foi cancer, foi um susto, foi rápido. As coisas mudaram. Foi a perda, e foi também o tempo passando. Os netos crescendo. As vezes é dificil criar asas, difícil ver os filhos criando asas. Cada um criou asas da sua forma.
2014
Um tempo depois, foi o Valdir. Cancer, de novo. Batalha perdida. No mesmo ano, a Valeria perdeu o sogro. Um senhor tao forte, vivo, saudável, falante, engraçado. Foi cancer, foi rápido.
2015
Um ano e meio depois, foi embora o vô Luiz, dessa vez foi a idade, era sua hora. Ficou pouco não resolvido, pouco não vivido. No mesmo ano, o Valter também perdeu o sogro. Também de idade, um senhorzinho que até o ultimo segundo sabia de tudo que acontecia, não perdeu a noção do mundo, nem por um minuto.
Em 2016, foi ontem, foi o Leandro, filho da Valéria, meu primo. O quarto neto, 28 anos. Quanta vida, quantos sonhos, quantos dias felizes. Neto que mais soube aproveitar a vida, que mais se divertia. Talvez o que menos se preocupava com o futuro, que bom. O mais bonito. Corinthiano. Batalhou por pouco mais de 1 ano. Foi cancer, foi rapido. Batalhou tantas quimios, cirurgias, prognosticos ruins, a angustia, dores, mal estar. E lutou com ele seus pais, seu irmao, sua namorada, tantos amigos. Como tinha amigos! Amigos da hora da bagunça, amigos da hora da dor. Não pude me despedir (essa ideia que eu tive que morar longe...).
O pai dele foi quem dirigiu meu pai de volta de Sao Paulo a Cruzeiro quando minha mãe se foi. Depois, repetiu comigo, quando foi a vez do meu pai. Eu sinto uma dor de pensar que em menos de três anos, seria com ele, com um filho. Dor que esta longe do meu entendimento.
Lê, voce deixa um vazio que se junta a tudo da minha infância que ja foi embora. Seu jeitinho de andar, seu jeito de chamar seu irmão, sua voz de descontentamento quando ficava frustrado, as caronas muitas que peguei pra SP. No Natal te vi tao bem, carequinha, mas forte, brincando. Achei que tudo iria terminar bem. Me disse que tinha que vir conhecer "essa Boston ai", queria ver jogo do Tom Brady. Te falei que da próxima te levava uma camiseta. Sinto não ter tido tempo, sinto não poder ver seu filho de olhos azuis. Sinto tanto, e ate agora não sei como isso pode ter acontecido.
Mas acima de tudo sinto pela sua familia, esses que estavam com voce nas noites de dor e angustia, que fizeram tudo por voce. Que pararam a vida, que nao pouparam dinheiro, nem tempo, nem idas e vindas, nada, nada. Eles nao desistiram da cura. Hoje meu maior pedido é que seus pais achem novamente o animo, a alegria de dias simples. Que a lembranca sua seja o amor, que nao acaba, que é sim mais forte que a fé e esperança, porque elas acabam, quando o que resta é o amor. Que eles encontrem sentido nessa dor, que a tomem pra eles, que a carreguem e a controlem todos os dias, para que ela nao os paralizem, mas que os facam seguir em frente por voce. Que o sonho que eles tinham para voce, seja agora o sonho que voce tinha para eles: que eles sobrevivam. É uma tarefa dura, tarefa de uma vida inteira.
E que venha logo a cura, por vocês todos. Cansamos tanto. Que todos nós, 5 netos, 2 filhos, genro e nora da dona Gilda estejamos aqui para ver. E vamos suspirar, com alivio e saudade.
"E amanhã posso chorar por não poder te ver
Mas o seu sorriso vale mais que um diamante
Se você vier comigo, aí nós vamos adiante
Com a cabeça erguida e mantendo a fé em Deus
O seu dia mais feliz vai ser o mesmo que o meu
A vida me ensinou a nunca desistir
Nem ganhar, nem perder mas procurar evoluir
Podem me tirar tudo que tenho
Só não podem me tirar as coisas boas que eu já fiz
Pra quem eu amo
E eu sou feliz e canto e o universo é uma canção
E eu vou que vou
Mas o seu sorriso vale mais que um diamante
Se você vier comigo, aí nós vamos adiante
Com a cabeça erguida e mantendo a fé em Deus
O seu dia mais feliz vai ser o mesmo que o meu
A vida me ensinou a nunca desistir
Nem ganhar, nem perder mas procurar evoluir
Podem me tirar tudo que tenho
Só não podem me tirar as coisas boas que eu já fiz
Pra quem eu amo
E eu sou feliz e canto e o universo é uma canção
E eu vou que vou
História, nossas histórias
Dias de luta, dias de glória"
Dias de luta, dias de glória"
(https://www.youtube.com/watch?v=i4FQJ7Qi14o) - Charlie Brown Jr.
sábado, 16 de julho de 2016
Sobre as maiores abominações
18 de junho de 2016
Eu ando triste, um triste meio novo. Eu quase sempre sou feliz mas sempre preciso de um dia aqui, e outro ali pra ser triste. Ja fui triste sem razão, ja fui triste por saudade doída, ja fui triste por dúvida, já fui triste por raiva da vida. Já fui triste de doer entre o estômago e a garganta, já fui triste pra perceber a beleza de céu tão cotidiano. Mas ando triste diferente. Ando triste com o mundo. Choro com a dor do personagem inventado. Choro com o filho chorando no velório da mãe que se colocou entre ele e o doido com armas. Triste com o caminho do mundo, que ao invés de andar pra frente, cambaleia como nunca, retorna a passos largos. Todo mundo compartilha sem partilhar. Todo mundo ta certo, e ponto! Quero ver só o que eu quero, e me deixe aqui na minha santa ignorância. O mundo dos injustos, dos racistas, dos machistas, dos homofóbicos, todos de bem, pessoas de bem, que odeiam. O mundo do ódio.
Minha fé me permite odiar. Odiar meu irmão, minha sobrinha, meu tio. Que Deus os perdoe! Quanto pecado! "Não atire a primeira pedra". Minha fé remove montanhas, e as coloca bem aqui, entre eu e você, para que eu não te veja. Para que eu me veja, e só, e ache que sou o centro do mundo. Não Deus, não as crianças, não os animais, não aquele que ama, não aquele que se doa, não aquele que vive uma vida justa sem julgar ninguém, não aquele que não vai na igreja porque cansou de ser parte de um grupo que em essência exclui. O centro do mundo sou eu, eu e minha interpretação completa e única do que Deus quis dizer quando disse "ame o seu proximo". A fé move montanhas, e as coloca entre eu e meu próximo. "A fe é a certeza daquilo que não vemos". Minha fé, a certeza que estou certo mesmo sem estar. E fecho os olhos e os ouvidos, e abro a boca e falo sem parar, e sem pensar. E em nome de Deus alimento o ódio, o rancor, a violência, a falta de cuidado com quem não tem o que comer. Em nome de Deus faço tudo, menos ser uma pessoa melhor.
"Estas seis coisas o Senhor odeia, e a sétima a sua alma abomina: olhos altivos, língua mentirosa, mãos que derramam sangue inocente, o coração que maquina pensamentos perversos, pés que se apressam a correr para o mal, a testemunha falsa que profere mentiras, e o que semeia contendas entre irmãos." Provérbios 6:16-19.
Eu ando triste, um triste meio novo. Eu quase sempre sou feliz mas sempre preciso de um dia aqui, e outro ali pra ser triste. Ja fui triste sem razão, ja fui triste por saudade doída, ja fui triste por dúvida, já fui triste por raiva da vida. Já fui triste de doer entre o estômago e a garganta, já fui triste pra perceber a beleza de céu tão cotidiano. Mas ando triste diferente. Ando triste com o mundo. Choro com a dor do personagem inventado. Choro com o filho chorando no velório da mãe que se colocou entre ele e o doido com armas. Triste com o caminho do mundo, que ao invés de andar pra frente, cambaleia como nunca, retorna a passos largos. Todo mundo compartilha sem partilhar. Todo mundo ta certo, e ponto! Quero ver só o que eu quero, e me deixe aqui na minha santa ignorância. O mundo dos injustos, dos racistas, dos machistas, dos homofóbicos, todos de bem, pessoas de bem, que odeiam. O mundo do ódio.
Minha fé me permite odiar. Odiar meu irmão, minha sobrinha, meu tio. Que Deus os perdoe! Quanto pecado! "Não atire a primeira pedra". Minha fé remove montanhas, e as coloca bem aqui, entre eu e você, para que eu não te veja. Para que eu me veja, e só, e ache que sou o centro do mundo. Não Deus, não as crianças, não os animais, não aquele que ama, não aquele que se doa, não aquele que vive uma vida justa sem julgar ninguém, não aquele que não vai na igreja porque cansou de ser parte de um grupo que em essência exclui. O centro do mundo sou eu, eu e minha interpretação completa e única do que Deus quis dizer quando disse "ame o seu proximo". A fé move montanhas, e as coloca entre eu e meu próximo. "A fe é a certeza daquilo que não vemos". Minha fé, a certeza que estou certo mesmo sem estar. E fecho os olhos e os ouvidos, e abro a boca e falo sem parar, e sem pensar. E em nome de Deus alimento o ódio, o rancor, a violência, a falta de cuidado com quem não tem o que comer. Em nome de Deus faço tudo, menos ser uma pessoa melhor.
"Estas seis coisas o Senhor odeia, e a sétima a sua alma abomina: olhos altivos, língua mentirosa, mãos que derramam sangue inocente, o coração que maquina pensamentos perversos, pés que se apressam a correr para o mal, a testemunha falsa que profere mentiras, e o que semeia contendas entre irmãos." Provérbios 6:16-19.
A grande negação
Julho 15, 2016
A Terra gira estranha, empurrando todo mundo, que segue aos trancos e barrancos. Com as dores de ser gente que sente, que pensa, que rumina, que significa. Que ao ver o final do ciclo da vida perde o sentido em viver. Que tem na distância física não apenas um numero de quilômetros, metros, e milhas, mas também um buraco, que queima e congela, tudo junto, ao mesmo tempo. Que vive segundos que são horas, e horas que são sua vida inteira. Ao ver gente virar pétala a gente cai na terra, aos prantos, sem entender nada. É a nossa grande negação, que nos mantém vivos, saltitantes e sorridentes por ai, é a ilusão necessária. Que esconde o maior segredo que seu coração de gente, fraco e sem ritmo, fingi que esqueceu: um dia, todos, de gente viramos flores, e planetas, e pedaços de nuvens. De seres pensantes e cheios de vontades, viramos uma lembrança, um buraco na vida de alguéns. Buraco, sem quilômetros, nem metros, nem milhas. Infinito. Quem não se engana, chora a cada esquina. Não quer levantar. Sente o peso. Que isso menina! Olhe seus minutos, é contagem regressiva: vai sorrir também!
sexta-feira, 6 de maio de 2016
Em uma pétala
"Não se esqueça da sua mãe". Tem sido assim, emails e mais emails. Quase fiquei brava. Sabe, eu tento disfarçar, tento seguir, até consigo. Sou essa dor, mas sou também essa força. Mas ai vem vocês, assim, me lembrando do buraco de dimensões infinitas. Eu não me esqueci.
Ah, eu a procuro, em todo lugar.
Posso ser feliz? Apenas nos dias cotidianos, comuns, insignificantes. Num dia especial, cade você? E passam rápido, em 3 segundos, cenas desse filme: infância, quintal, abacateiro, cachorrinhos, arroz e feijão, olhar com disciplina, palavras de amor, reunião da escola, paredes pintadas, sorriso orgulhoso, descontos, lasanha, coxinha, ônibus, marmitinha, hospital, bolsinhas de sangue, bolsinhas de quimio, macas, olhar triste, olhar assustado, palavras sem nexo, sono, silêncio.
Silêncio. Silêncio.
Nos dias cinzas, lágrimas, que duram menos, mas ainda duram. Quase 8. De tanto silêncio. Você me pediria para parar. "É...é a vida". "Olha eu e meus irmãos? Foi assim, tão cedo, tão mais cruel". Talvez me olharia com aquele olhar desconcertado que me olhou quando chorei por horas quando não passei no meu primeiro vestibular. "Agora você estuda, tem tempo de tirar a carteira, passa mais um ano aqui". Ah foi mais um ano com você.
Nos dias de sol, nuvens lindas, céu azul. Flores. Cade você? Em tudo isso. "De volta a atmosfera com gotas de Jupiter em seus cabelos, ela age como verão, e anda como a chuva". Olhos perdidos, sorriso tímido com a boca fechada, brava, ciumenta, forte, fala alto, diplomas, "como é bom dormir". Cade você? Em mim. Na pétala que acabou de nascer, e na que acabou de cair. No bebê que riu na estação. Naquela música nova. Quando durmo. No Japão, em Roma, em Lisboa. "Sua mãe mora em SP?" Não, mas não se sinta mal. Gosto de dizer, ela mora em todos os lugares. E ela vê tudo isso, os dias de chuva e os dias de sol. E ela se orgulha, dos dois.
Ah, eu a procuro, em todo lugar.
Posso ser feliz? Apenas nos dias cotidianos, comuns, insignificantes. Num dia especial, cade você? E passam rápido, em 3 segundos, cenas desse filme: infância, quintal, abacateiro, cachorrinhos, arroz e feijão, olhar com disciplina, palavras de amor, reunião da escola, paredes pintadas, sorriso orgulhoso, descontos, lasanha, coxinha, ônibus, marmitinha, hospital, bolsinhas de sangue, bolsinhas de quimio, macas, olhar triste, olhar assustado, palavras sem nexo, sono, silêncio.
Silêncio. Silêncio.
Nos dias cinzas, lágrimas, que duram menos, mas ainda duram. Quase 8. De tanto silêncio. Você me pediria para parar. "É...é a vida". "Olha eu e meus irmãos? Foi assim, tão cedo, tão mais cruel". Talvez me olharia com aquele olhar desconcertado que me olhou quando chorei por horas quando não passei no meu primeiro vestibular. "Agora você estuda, tem tempo de tirar a carteira, passa mais um ano aqui". Ah foi mais um ano com você.
Nos dias de sol, nuvens lindas, céu azul. Flores. Cade você? Em tudo isso. "De volta a atmosfera com gotas de Jupiter em seus cabelos, ela age como verão, e anda como a chuva". Olhos perdidos, sorriso tímido com a boca fechada, brava, ciumenta, forte, fala alto, diplomas, "como é bom dormir". Cade você? Em mim. Na pétala que acabou de nascer, e na que acabou de cair. No bebê que riu na estação. Naquela música nova. Quando durmo. No Japão, em Roma, em Lisboa. "Sua mãe mora em SP?" Não, mas não se sinta mal. Gosto de dizer, ela mora em todos os lugares. E ela vê tudo isso, os dias de chuva e os dias de sol. E ela se orgulha, dos dois.
segunda-feira, 2 de maio de 2016
Minhas mais sinceras faltas de sentido
Outubro 9,
2015
https://www.youtube.com/watch?v=BW9Fzwuf43c
Talvez chamem
de coragem, talvez desapego, talvez até falta de consideração. Falta de raízes?
Confiança? Vontade de largar tudo? Vontade de levar tudo? Imigrar, me
lembram pássaros, que quando o tempo fica frio decidem voar. Mas voltam, quase
sempre.
Ha pouco mais
de 4 anos decidi sem pensar que iria entrar no avião. Meu pai não se
conformou. Na verdade não tive coragem de contar pra ele. Falei bem aos
poucos, disse que seria por um tempo. Meu primeiro ano foi terrível: remorso,
saudade, falta de liberdade, burocracia. Acostumar com a língua, acostumar em
ser o outro, não pertencer. Alguns dias eu não acordei. Um dia fui na
prefeitura, assinei um papel, casei. Foi uma das coisas mais estranhas que fiz.
Não parecia um selo de amor, parecia um contrato em que eu concordava em deixar
pra trás quase tudo.
Então veio os
piores tempos. Meu pai, no Brasil, descobriu uma doença sem cura. A decisão de
morar longe pra sempre já não tinha um “para sempre” tão longo, era curto. Me
contorci. Fiquei no Brasil o máximo que pude. Tive que ficar um tempo longe do
meu pai. Acabei voltando para suas ultimas semanas. Assisti sua ida, dia apos
dia, até o ultimo suspiro. Nos despedimos pra sempre. Com ele foi embora a menina em mim. Me desfiz do que tinha de material no Brasil. Me desfiz de tanto. Entrei no
avião e trouxe comigo tudo o que eu sempre tive.
Então veio a
fase mais fácil. Sonho, conquista. Por um ano estudei numa das mais renomadas universidade do
mundo, conheci pessoas parecidas comigo, fiz amigos. Vi sentido em estar aqui.
Agora, depois
dos baixos e altos, chegou a época do meio, do morno. Os dias de rotina,
trabalhar, juntar dinheiro, comer, viajar. E ai?
Me incomoda
quando vejo reclamarem que hoje as relações estão baseadas em redes sociais. É
tudo que tenho.
Me incomoda quando leio que o sentido da vida é família. Porque
se for, eu deixei tudo isso pra trás. E as vezes não sei exatamente o porquê.
Eu sempre sonho que meu pai esta super bravo comigo. Desconfio que seja eu
mesma brigando comigo, no assunto que meu pai mais discordava comigo: onde eu
devia morar. Onde eu deveria morar?
Na verdade, já
não tenho escolha. Pai, mãe, netos, almoço de domingo. Nunca, não importa onde eu
esteja. Talvez por isso o lugar onde eu more hoje me traga uma paz estranha que
nunca senti antes, talvez seja exatamente por me proteger na distancia. Para
não ficar sozinha, escolho eu mesma me tornar sozinha. O que te parece um
extremo desapego, pode ser apenas uma forma de auto proteção. E o sentido da vida?
Criar listas
de coisas pra fazer, e o sentido da vida passa a ser completar cada uma. Me
peguei fazendo listas de coisas pra comprar, e quando faço o “check” me sinto
feliz. Mas mais tarde, na hora de dormir, me bate que na verdade nada tinha sentido
algum, era vazio, era oco. Será que eu trabalho pra ficar feliz quando compro caixas
para organizar a casa, ou quando compro um brinco?
Também passei
a fazer listas de coisas saudáveis pra comer. Fico animada, mas logo cansa. Cadê
a alegria de comer coisas gostosas? Faz sentido ir atrás da saúde quando na
verdade verdadeira esta cada vez mais difícil prever o que pode causar o que?
Faz algum
sentido fazer tudo isso e não poder almoçar com meu irmão? Sentido nenhum.
Tento achar
sentido nos encontros com outras pessoas, os desconhecidos. Quando alguém me
agradece uma gentileza no transito, ou quando dou risada mega alta no meu local
de trabalho.
Mas será que
faz sentido isso tudo, se não posso tomar café da tarde com minhas tias? Não,
não.
Ai tento ir
atrás do sentido no que me resta. Preciso me colocar na posição de alguém que
não esta com os seus, mas que assim como todo mundo faz parte de um maior. Ver
sentido na descoberta de como somos humanos, no encontro com pessoas que
cresceram a milhares de quilômetros de mim, mas com tanto em comum. Talvez o
sentido disso tudo seja não apenas em compreender como quem cresceu na mesma
cidade que você pode se tornar tão diferente, mas entender também que alguém que
cresceu no sul da Asia pode ser exatamente como você que cresceu na América do
Sul. Encontro sentido em fazer listas de lugares do mundo que quero ir, e
talvez quando “checar” o próximo da lista eu me sinta mais completa. Não estar no meu lugar, mas conquistar novos lugares, pra também chamar de meu. Sera que serão meus?
Sinto uma
dorzinha de acompanhar tudo por fotos. Perdi o casamento de 3 amigas. Tenho
super amigos com bebês que ainda nem conheço. Mas eu gosto da expectativa dos
encontros raros, e da alegria do avião descendo. Eu gosto da mudança das
estações, uma super lição de resiliência e transformação, da qual nunca me
canso. Eu gosto da força que carrego com todo mundo em mim. Meu mundo interno é
super povoado.
E ai não
importa onde eu esteja, esse mundo vai comigo. Será?
Existe uma pergunta que
sempre ronda por ai: o que você estaria fazendo se soubesse que iria morrer
amanha? É nessa pergunta que me esbarro, tropeço. Eu não estaria onde estou
hoje, eu estaria no Brasil. Mas que pergunta mais besta! A gente não deve viver
como se fosse morrer amanha. A gente tem que achar o meio termo, aquela linha
tênue entre fazer o melhor, pensando num futuro e não deixando o hoje passar.
Agora se não for assim, tudo bem, quem sabe quando será ne? Escuto de pessoas
que moram aqui, também imigrantes, como é triste ter os pais envelhecendo
longe. Os meus não estão envelhecendo sem mim. Alivio, ou desamparo? E os
outros? E minha serra, está envelhecendo sem mim?
E ela, com
tanto medo, avião descendo, pronta para os encontros raros, almoços, e cafés da
tarde, escreveu uma carta honesta ao seu pedaço de mundo depois de quase 2 anos
ausente. E faltou sentido, fechou os olhos com vergonha, e começou assim:
“Vim com um
medo danado. É difícil ver meu povo, meu sangue, apenas de tempos em tempos. Meu lugar
vai me reconhecer? Serei uma estranha quando olhar nos seus olhos?
Primeira vez que venho sem ter uma casa. (Pausa para respirar, porque essa
constatação me rouba o ar por 3 segundos). Eita Tempo, te ver assim na minha
frente, que medo! Desde a ultima vez ela cresceu 10 cm. Ela virou mãe de
duas meninas. Ja me decepcionei com eles. Ela se casou e já comemorou um ano de casamento. Ela ja fez
18 anos. Ela esta terminando a faculdade. Ele já foi e voltou de uma imensa
batalha: venceu. Ninguém está se tornando mais jovem. O tempo passou, e cortaram a primavera. Fecharam algumas
lojas, pouquíssimas abriram. Meu vozinho descansou.
A tia da minha mãe também. Eu não estava aqui. Foi tudo bem rápido, me
ausentei, a vida continuou, parou, aqui e la. Quem viu? Quem entende? Algumas dores
continuam. Outras novas surgiram.
Respondi algumas questões, criei novas perguntas. Obrigada pelo verão mais
quente, minha terra! Que eles descansem bem em você. Que um dia eu também me junte a você, porque, na verdade, a gente sempre sabe a que lugar pertence. Não se esqueça de mim.”
segunda-feira, 4 de abril de 2016
Sobre a melancolia
Hoje nevou, em abril, mesmo ja sendo primavera. Ir pro trabalho não é legal, andar na rua é cansativo, faz frio, tem que andar com cuidado para não cair. Tentei falar no celular, não deu, meus dedos começaram a doer, tive que desligar. Fez -4. Deve ser aquecimento global. Há 3 dias fez 20 graus, todo mundo saiu na rua, alguns galhinhos verdes começaram a aparecer. No dia seguinte, caiu a temperatura, nevou, todo mundo voltou pra dentro, os galhinhos quebraram. Ninguém aguenta mais o frio, sair com bota e casaco. Inverno cansa, todo mundo espera ansioso pela primavera, mas as vezes...não dá. Temos que aguentar, só mais um pouquinho na esperança de dias melhores, coloridos, sol quentinho, pessoas felizes.
É difícil aguentar os dias cinzas, mas é tão preciso. E é também tão bonito. As folhas só aparecem depois do ciclo todo. Não me canso de admirar o ciclo que ocorre todo ano. No verão, tudo tão verde! No outono, primeiro lindo, amarelo e vermelho, depois tudo marron, já feio, folhas mortas. No inverno, nada, só galhos. A primavera - minha favorita - traz aquele primeiro dia em que todas as folhas aparecem juntas, como se tivessem combinado que já era hora de fazer todo mundo feliz.
Mas metade do ano é frio, seco, branco, cinza. E ainda bonito! Existe uma beleza tão linda nos galhos secos carregando neve. E hoje tirei essa foto, 4 de abril:
E lembrei de um texto que li esses dias sobre a melancolia, uma palavra que soa tão bonita, mas que as vezes é associada com coisas negativas. Não é depressão, não é pessimismo. E esse texto que li descreve tão bem. Melancolia é "uma tristeza que aparece quando estamos abertos para o fato que a vida é inerentemente difícil, e que sofrimento e decepções são partes essenciais da experiência universal". É uma aceitação que tudo bem não ser feliz e saltitante de alegria o tempo todo. Melancolia "é um importante estado mental, e muito valioso, porque relaciona dor com beleza e sabedoria". Este é um dos textos que me fazem me sentir ok com o que eu sou, e com o que eu sinto. Tudo bem sentir a necessidade de se recolher por uns dias, e ficar triste. É uma forma de recarregar as energias, e sentir bem nos outros dias.
Um dos lugares mais melancólicos em que eu já estive foi há alguns semanas, estive no Japão. Um fato que não pensei tanto antes de ir, era o quanto minha mãe costumava falar que queria conhecer o Japão. Era uma coisa dela com meu irmão. Ela tinha interesse na cultura, e meu irmão gostava de videos games e tecnologia. Mais pro final da viagem, fui a Kyoto, uma cidade mais antiga com vários templos e lugares lindos. Fui neste templo chamado Ginkaku-ji (Pavilhão Prateado), que tem um dos jardins mais lindos que já vi. Comecei a andar sozinha pelo jardim, deixei meu marido tirando fotos. Andei, admirando a beleza, o detalhe da grama que é feita de musgo, num tom verde amarelado lindo. As árvores tem copas que parecem terem sido esculpidas de tão perfeitas. Ainda corre um pequeno riachinho, feito sim por mãos de homens, mais desenhado com perfeição. Chorei demais, pela beleza, mas também por pensar em como minha mãe (e meu pai) adoraria aquele lugar. Em como ela nunca mais vai ter sofrimento, mas também nunca mais verá nada. Não saberia da minha viagem, nem que eu tinha chorado naquele jardim. É uma sensação estranha de desamparo, e solidão. Fiquei triste, mas também me admirei com a beleza do lugar, e a beleza da minha dor. Como essas dores me ensinam. De alguma forma minha mãe esteve ali comigo.
Hoje era aniversário dela.
É difícil aguentar os dias cinzas, mas é tão preciso. E é também tão bonito. As folhas só aparecem depois do ciclo todo. Não me canso de admirar o ciclo que ocorre todo ano. No verão, tudo tão verde! No outono, primeiro lindo, amarelo e vermelho, depois tudo marron, já feio, folhas mortas. No inverno, nada, só galhos. A primavera - minha favorita - traz aquele primeiro dia em que todas as folhas aparecem juntas, como se tivessem combinado que já era hora de fazer todo mundo feliz.
Mas metade do ano é frio, seco, branco, cinza. E ainda bonito! Existe uma beleza tão linda nos galhos secos carregando neve. E hoje tirei essa foto, 4 de abril:
E lembrei de um texto que li esses dias sobre a melancolia, uma palavra que soa tão bonita, mas que as vezes é associada com coisas negativas. Não é depressão, não é pessimismo. E esse texto que li descreve tão bem. Melancolia é "uma tristeza que aparece quando estamos abertos para o fato que a vida é inerentemente difícil, e que sofrimento e decepções são partes essenciais da experiência universal". É uma aceitação que tudo bem não ser feliz e saltitante de alegria o tempo todo. Melancolia "é um importante estado mental, e muito valioso, porque relaciona dor com beleza e sabedoria". Este é um dos textos que me fazem me sentir ok com o que eu sou, e com o que eu sinto. Tudo bem sentir a necessidade de se recolher por uns dias, e ficar triste. É uma forma de recarregar as energias, e sentir bem nos outros dias.
Um dos lugares mais melancólicos em que eu já estive foi há alguns semanas, estive no Japão. Um fato que não pensei tanto antes de ir, era o quanto minha mãe costumava falar que queria conhecer o Japão. Era uma coisa dela com meu irmão. Ela tinha interesse na cultura, e meu irmão gostava de videos games e tecnologia. Mais pro final da viagem, fui a Kyoto, uma cidade mais antiga com vários templos e lugares lindos. Fui neste templo chamado Ginkaku-ji (Pavilhão Prateado), que tem um dos jardins mais lindos que já vi. Comecei a andar sozinha pelo jardim, deixei meu marido tirando fotos. Andei, admirando a beleza, o detalhe da grama que é feita de musgo, num tom verde amarelado lindo. As árvores tem copas que parecem terem sido esculpidas de tão perfeitas. Ainda corre um pequeno riachinho, feito sim por mãos de homens, mais desenhado com perfeição. Chorei demais, pela beleza, mas também por pensar em como minha mãe (e meu pai) adoraria aquele lugar. Em como ela nunca mais vai ter sofrimento, mas também nunca mais verá nada. Não saberia da minha viagem, nem que eu tinha chorado naquele jardim. É uma sensação estranha de desamparo, e solidão. Fiquei triste, mas também me admirei com a beleza do lugar, e a beleza da minha dor. Como essas dores me ensinam. De alguma forma minha mãe esteve ali comigo.
Hoje era aniversário dela.
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