(Já aviso, texto longo, sem nexo, sem organização, talvez amanhã eu edite)
Já faz duas semanas e meia que
voltei do Brasil. Passei 15 dias por lá, todos em Cruzeiro. Foi bom e estranho.
Fiquei o tempo todo quase com meu pai. Ele realmente tinha dado uma piorada.
Estava dormindo mais, com a voz mais fraca. Eu tinha prometido para mim mesma
que iria aproveitar cada minuto, ficar de bom humor, ajudá-lo. Mas a realidade
não é bem assim. É dificil ficar bem quando alguém perto de você está com dor,
mal estar, dorme pouco. E relacionamentos humanos são tão complexos e intrincados em tantos fatores, que as vezes a gente nem entende a gente, quem
dirá entender o outro.
A primeira semana foi boa!
Calor, shortinho, havaianas! O natal passamos na casa nova da minha tia, que eu
estava ansiosa para conhecer. No final, o natal foi estranho!( Aqui é meu blog,
e posso ser sincera, bem sincera!) Em 2012 descobrimos a doença do meu pai uma
semana antes do natal. No dia mesmo da ceia eu estava convencida que seria o
último natal do meu pai, entrando no meu mecanismo de defesa favorito, a
racionalização. Foi dificil, e tudo me levou a decisão de ficar no Brasil por
seis meses. O resto eu já escrevi aqui.
Mas a vida surpreende, ainda
bem! Meu pai ficou firme, aguentou bem, e estava la com a gente passando o
natal em 2013! Que alegria deveria ser não? Mas estranhamente eu não senti nem
alegria, nem tristeza. Eu não senti nada! Estava completamente anestesiada de
qualquer coisa. Acho que eu não estava querendo muito era pensar em nada.
No final da noite um dos meus
queridos primos ficou meio pra baixo. Ele conversou comigo que andava triste, achando
o natal muito sem graça, pensando em como de repente nossa familia começou a
ter problemas, e de como sempre por muitos anos tudo deu muito certo! E é
verdade isso!!! Por anos e anos nos reunimos na casa da minha tia, com a
familia do meu tio (marido dela), e era sempre muito legal! Claro que também
tem o fato de sermos crianças, quando o natal tem sempre mais graça. Com o
tempo não ganhamos mais brinquedos, algumas pessoas vão casando e comemorando
com suas próprias famílias, outras pessoas vão embora, outras ficam doente.
E estavamos ali, natal de 2013, sem minha mãe,
sem a irmã dele que está fazendo intercâmbio, sem meu avô que esta tão doente
que nem pode sair da cama, com meu pai bem doente, o sogro da minha tia também
doente, e assim vai. Crescer não é divertido não! Meu primo estava bem sentido.
Eu não estava sentindo nada. Comecei a chorar, chorar de tristeza por não
sentir.
Meu tempo no Brasil foi tomado de
racionalizações. Como é díficil morar longe da família, ainda mais quando as
pessoas precisam de você, quando você cresce numa cultura em que estar com os pais
doentes é esperado. Sinto mesmo uma terrível culpa! Uma culpa tão grande que
talvez me consumisse se eu não racionalizasse tudo! Coloco tudo numa lógico bem
explicadinha de que tudo tem sua hora, de que preciso trabalhar, preciso
construir minha carreira, que escolhi ficar aqui e preciso ir em frente com
isso. Na verdade tudo é verdade mesmo! Moro aqui, tenho contas, imposto, coisas
que todos tem. Não posso simplesmente ficar no Brasil 6 meses todo ano. Esse
mundo não existe para mim.
Acontece que o que a gente pensa, nosso
caminho, nossas escolhas, nossas dores, são nossas! Não são de mais ninguém.
Como alguém vai entender minhas decisões se não andam nos meus pés? É dificil!
As vezes até acho que exijo muito esperando que me entendam. Esse foi um dos
meus conflitos no Brasil. Eu fui durante meu periodo de recesso. Muitas pessoas
estranharam eu ja voltando dia 6 de janeiro. Inclusive meu pai.
Ele sempre foi uma pessoa muito carente! Gosta
de pessoas por perto, de conversar. Ele na verdade nunca entendeu minha vinda
para cá. Nunca! Nem quando estava bem. Logo a primeira vez que vim passear e
conhecer meus sogros, passei pouco mais de um mês. Foi muito dificil ele
aceitar que eu nao passaria o natal com ele! Quando vim meio sem saber se
ficaria ou não, tive que pisar em ovos para contar a novidade! Imagina agora com
ele nessa situação?
Os últimos 3 dias no Brasil foram cheios de
conflitos! Meu pai fazendo mil comentários sobre minha vinda, dando indireta, e
eu dando minhas razões racionais. Choramos, até discutimos! Sei que na verdade
ele não me entende. Eu tenho medo de um dia sentir remorso por isso, mas a
verdade final para mim é isso: a gente toma decisões que tem consequências.
Maturidade é saber levar as consequências. Minha consequência é passar menos tempo
com minha família, e vir a sentir remorso por isso.
O problema maior, além do que eu
sinto, ou meu pai sente, é que ele piorou! Desde o começo eu já estava pensando
como eu conseguiria ir embora deixando meu pai lá daquele jeito. Ele estava
andando com dificuldade, falando com dificuldade. Dei sorte e consegui ir numa
consulta com meu pai. O médico estava ainda esperando o resultado da ressonância
do crânio (por conta da visão dupla). Ele receitou um remédio novo para dar
mais ânimo. No final me disse para voltar pros Estados Unidos tranquila que meu
pai ainda iria ficar firminho por um tempo. Ele deixou escapar que o fato de
meu pai ter ficado tanto tempo bem sem a quimio foi uma surpresa.
Tive outra sorte que no dia de
ir pro aeroporto a ressonancia ficou pronta, e consegui ver o resultado. Nada
de metástase cerebral (ufa!). Acabou que deixei meu pai relativamente bem, mais
conformado com minha volta.
No dia seguinte ele fez um exame
de punção lombar (a ressonancia apontou uma alteração que pode ter ligação com
infecção). E ele começou a passar mal! Foi só eu vir embora, ele piorou mais
ainda! Um dos meus queridos primos levou meu pai para o Hospital, ele estava
fraco, comendo pouco. Fizeram uma retirada de liquido do pulmão (há um tempo
estava acumulando liquido), e o internaram. Ele ficou internado quase uma
semana! E dormiu sozinho quase todos os dias. Minha tia foi todos os dias, meu
irmão passou o final de semana. Mas o resto do tempo ele ficou sozinho.
Foi uma semana dificil, em que a
distância só faz tudo piorar. Se eu estivesse lá poderia ficar o tempo todo com
ele, por exemplo! Pensei em tantas coisas. Quando eu ficava no hospital com
minha mãe eu sempre achava triste as pessoas que não tinham ninguém lá. A gente
julga muito sem saber, sem se colocar no lugar. A verdade é que ter alguém
doente na família envolve sempre muita gente, de formas diferentes. Se alguém
fica doente por 3 meses (como foi minha mãe) é mais fácil pessoas deixarem o
trabalho, familia, casa, se virar em mil e dar um jeito de ficar lá com a
pessoa. Minha mãe ficou doente de maio a agosto, julho inteiro eu e meu irmão
estávamos de férias! Ela estava na mesma cidade que a gente. Nós estavamos em
choque! Não deu tempo de incorporar a doença a vida.
Com meu pai não. É tudo ao
contrário.
Uma pessoa encontrou um dia meu
pai na rua e chorou pra ele, talvez com pena, e disse algo do tipo: “Não
acredito que sua filha de largou aqui assim”. Essa mesma pessoa disse algo
parecido para uma de minhas tias. Até entendo que esta pessoa não goste de mim,
e não me incomoda o comentário em si. O que me incomoda é a resposta das
pessoas que gostam de mim. Sou contra dramatizar o que já é dramático. Ouço
muitas coisas: “Não da pra você ficar mais?”. Se desse, eu ficava! “Ai que pena, seu pai gosta tanto de você aqui”.
Sim, eu já sei. “Nossa Aline, seu pai ta tão magro!”. Eu sei, ele também sabe.
Uma outra pessoa muito querida um dia me disse: “Ah, mas seu pai não dura
muito, ne?”. Quem sabe né? Um colega do meu pai levava o sogro com câncer no
hospital toda semana, e as vezes nos encontrávamos. O sogro morreu ontem, um
radialista de Cruzeiro. O genro,colega do meu pai, morreu meses atrás! Quem sabe quem morre quando ne? Concordo que
as chances do meu pai ir antes de mim são muito altas. Mas quem sabe? Ningúem!
Meu pai fica chateado comigo as
vezes porque ele acha que eu não tenho fé, que eu não acredito. A verdade é que
eu acredito e muito que a gente pode se surpreender com o andamento de doenças.
Acredito sim que existe mais do que a gente vê. Mas também leio muito sobre câncer,
sei os tratamentos usados para canceres como do meu pai, sei as estatísticas,
todos os numerozinhos de um dígito. Minha racionalização é: simplificar tudo!
Sem drama, sem lágrimas desnecessárias, sem querer adivinhar o futuro, saber
quando, quem, onde. No fim a gente tem mesmo que viver um dia por vez! Hoje
estar feliz, sobreviver por hoje, viver sem culpa por hoje.
Meu pai saiu da internação bem
melhor. Mudou-se pra perto da minha vó e minha tia, trancou nossa casa. Eu sei
que foi melhor pra ele, ele está já bem melhor e animado, tendo mais pessoas
por perto, mais assuntos. Começou de novo as quimios. Fiquei melhor também!
Esta semana, quando ligo pra ele, ele sempre está animado, falante, com a voz
forte, cheio de assunto. Isso é vida, não?
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