quarta-feira, 29 de janeiro de 2014

Pai na UTI, volta urgente ao Brasil!

De um dia pro outro, tudo muda!
Terminei meu último post feliz, com meu pai animado, e eu conseguindo ficar bem nos Estados Unidos.
No sábado a tarde liguei para meu pai, e minha avó atendeu. Estava uma confusão! Meu pai tinha acabado de cair no banheiro, minha avó estava esperando meu tio chegar para ajudar meu pai a se levantar. Eu fiquei sem entender! Tentei falar com meu pai, mas ele não estava conseguindo falar. Minha avó fazia perguntas para ele, mas ele não respondia direito. No final ele pegou no telefone, mas ele não falava coisa com coisa. Começou a contar histórias sem nexo, a chamar todo mundo de mãe, a misturar os sintomas dele com sintomas da minha avó. Fiquei desesperada! Eu perguntava X, ele respondia Y. Comecei até a achar que era problema na ligação, mas logo minha tia chegou, pegou no telefone, e consegui conversar com ela normalmente.
Em poucas horas meu pai ficou completamente sem noção! Liguei para ele algumas vezes, falei com minha tia, e conseguia ouvir ele falando frases sem sentido. Falei pra ela levá-lo ao hospital.
Tia Sueli, tio Valter, e o Seu Martins (uma pessoa excepcional, que dirigiu meu pai ao hospital várias vezes na minha ausência, que nem é da família, nem pede nada em troca) levaram meu pai até Guaratinguetá, onde fica o hospital.
O primeiro médico o dispensou, disse que tudo era problemas da doenças. Minha tia insistiu. O segundo médico viu gravidade, e mandou ele para a UTI. O quadro tinha piorado e estava causando confusão mental.

O tempo todo me comuniquei com minha tia por meio do Whatsapp. Gente, que dificil! Não dormi, coração ficou apertado! Meu pai na UTI, com risco, e eu longe! Fiquei com medo de acontecer o pior e eu estar longe! Domingo às 10 da manhã marquei um voo para às 10 da noite. Eu tinha tomado a decisão de voltar para os Estados Unidos depois do ano novo, porque achei mesmo que ele iria ficar firminho por um tempo. Acabou que três semanas depois estava eu de novo no aeroporto vindo para o Brasil. Ainda bem que a viagem foi confortável, extra espaço no avião, recorde de tempo na imigração e pegar malas.

Encontrei com meu irmāo no aeroporto, e fomos direto para o Hospital. Chegamos exatamente na hora da curta visita da UTI. Eu nunca tinha entrado numa UTI. Assim que entramos meu pai abriu bem os olhos e disse: "Cade meu povo?". Quando ele reconheceu que era eu e o Tiago ficou espantado e disse: "Não acredito que vocês estão aqui! Não acredito!" Repetiu, e repetiu isso. Chorou! Logo reparei que ele tinha dado uma melhorada, já sabia onde estava. Fez perguntas do que tinha acontecido com ele, o porquê de estar ali. Admirou-se de eu estar ali! De ter voltado tão rápido.

O médico conversou comigo, disse que quando ele entrou na UTI fizeram exames para avaliar metastases cerebrais ou mesmo trauma causado pela queda. Os exames da cabeça estavam ok. Mas as metástases no fígado e pulmão tinham aumentado muito. Além disso, todos os exames de sangue estavam ruins, anemia, poucas plaquetas, etc. O médico queria mandá-lo para o quarto, pois assim teria mais tempo de visita e poderia ter acompanhante. Então eu cheguei, e ele já passou para o quarto.

Meu irmão passou a primeira noite com ele, noite passada fui eu.

Agora estou aqui, e já cheguei no limite de ir e vir dos Estados Unidos (caro caro!). Meu pai deu uma melhorada, mas simplesmente não posso ir embora. Cada dia é diferente. Amanhã ele pode ter outra crise, acontecer alguma coisa. Infelizmente é uma doença progressiva. E a verdade é que ele está precisando de cuidados 24 horas, e não tem ninguém para fazer isso. Todo mundo tem trabalho, tem sua própria vida. Mas se alguém vai abrir mão dessas coisas, parece-me que tem que ser os filhos.

Na segunda-feira eu estava me sentindo bem! Cheguei, meu pai já teve alta, estava melhor, vi como ele ficou feliz de me ver. Senti em paz comigo, algo que eu já não estava sentindo estando longe.

Esta noite passei a noite no hospital, e já comecei a ter sentimentos negativos por estar aqui. Embora acho que tudo dentro da normalidade. Quem mora em algum lugar longe da familia, acaba sempre sentindo que falta algo, nao importa onde você esteja. E a verdade verdadeira, que talvez pareça individualista e egoísta, é que eu me acostumei muito em fazer as coisas para mim mesma no dia a dia. Mesmo estando muito preocupada com meu pai, eu estava contente com minha vida em NY. Eu estava extremamente satisfeita com meus dois trabalhos. Dar aulas de português estava sendo muito divertido e desafiador, eu estava aprendendo muito. E TODOS os alunos são muito legais! Além disso, eu estou muito acostumada a fazer tudo com meu marido, a passar horas juntos, mesmo que os dois estejam estudando/trabalhando em silêncio na mesma mesa. A gente precisa um do outro. Ficar longe é extremamente difícil.  

Meu marido me disse uma coisa que estou tentando fazer. Ja que estou aqui, tenho que me concentrar em estar aqui. Estou tentando. Nao posso ficar pensando no que estou perdendo, dos trabalhos que joguei pro alto, de levar minha vida normalmente. Tenho que me concentrar em ajudar meu pai nesta hora em que ele precisa de mim. Eu tenho absoluta certeza que a longo prazo esta minha segunda "parada" na minha própria vida vai ser apenas um momentinho, mas a sensação de que eu fiz o que tinha que fazer vai durar muito e muito tempo.




quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

Racionalização



              (Já aviso, texto longo, sem nexo, sem organização, talvez amanhã eu edite)

              Já faz duas semanas e meia que voltei do Brasil. Passei 15 dias por lá, todos em Cruzeiro. Foi bom e estranho. Fiquei o tempo todo quase com meu pai. Ele realmente tinha dado uma piorada. Estava dormindo mais, com a voz mais fraca. Eu tinha prometido para mim mesma que iria aproveitar cada minuto, ficar de bom humor, ajudá-lo. Mas a realidade não é bem assim. É dificil ficar bem quando alguém perto de você está com dor, mal estar, dorme pouco. E relacionamentos humanos são tão complexos e intrincados em tantos fatores, que as vezes a gente nem entende a gente, quem dirá entender o outro.

                A primeira semana foi boa! Calor, shortinho, havaianas! O natal passamos na casa nova da minha tia, que eu estava ansiosa para conhecer. No final, o natal foi estranho!( Aqui é meu blog, e posso ser sincera, bem sincera!) Em 2012 descobrimos a doença do meu pai uma semana antes do natal. No dia mesmo da ceia eu estava convencida que seria o último natal do meu pai, entrando no meu mecanismo de defesa favorito, a racionalização. Foi dificil, e tudo me levou a decisão de ficar no Brasil por seis meses. O resto eu já escrevi aqui.

                Mas a vida surpreende, ainda bem! Meu pai ficou firme, aguentou bem, e estava la com a gente passando o natal em 2013! Que alegria deveria ser não? Mas estranhamente eu não senti nem alegria, nem tristeza. Eu não senti nada! Estava completamente anestesiada de qualquer coisa. Acho que eu não estava querendo muito era pensar em nada.

                No final da noite um dos meus queridos primos ficou meio pra baixo. Ele conversou comigo que andava triste, achando o natal muito sem graça, pensando em como de repente nossa familia começou a ter problemas, e de como sempre por muitos anos tudo deu muito certo! E é verdade isso!!! Por anos e anos nos reunimos na casa da minha tia, com a familia do meu tio (marido dela), e era sempre muito legal! Claro que também tem o fato de sermos crianças, quando o natal tem sempre mais graça. Com o tempo não ganhamos mais brinquedos, algumas pessoas vão casando e comemorando com suas próprias famílias, outras pessoas vão embora, outras ficam doente.

E estavamos ali, natal de 2013, sem minha mãe, sem a irmã dele que está fazendo intercâmbio, sem meu avô que esta tão doente que nem pode sair da cama, com meu pai bem doente, o sogro da minha tia também doente, e assim vai. Crescer não é divertido não! Meu primo estava bem sentido. Eu não estava sentindo nada. Comecei a chorar, chorar de tristeza por não sentir.

Meu tempo no Brasil foi tomado de racionalizações. Como é díficil morar longe da família, ainda mais quando as pessoas precisam de você, quando você cresce numa cultura em que estar com os pais doentes é esperado. Sinto mesmo uma terrível culpa! Uma culpa tão grande que talvez me consumisse se eu não racionalizasse tudo! Coloco tudo numa lógico bem explicadinha de que tudo tem sua hora, de que preciso trabalhar, preciso construir minha carreira, que escolhi ficar aqui e preciso ir em frente com isso. Na verdade tudo é verdade mesmo! Moro aqui, tenho contas, imposto, coisas que todos tem. Não posso simplesmente ficar no Brasil 6 meses todo ano. Esse mundo não existe para mim.

Acontece que o que a gente pensa, nosso caminho, nossas escolhas, nossas dores, são nossas! Não são de mais ninguém. Como alguém vai entender minhas decisões se não andam nos meus pés? É dificil! As vezes até acho que exijo muito esperando que me entendam. Esse foi um dos meus conflitos no Brasil. Eu fui durante meu periodo de recesso. Muitas pessoas estranharam eu ja voltando dia 6 de janeiro. Inclusive meu pai.

Ele sempre foi uma pessoa muito carente! Gosta de pessoas por perto, de conversar. Ele na verdade nunca entendeu minha vinda para cá. Nunca! Nem quando estava bem. Logo a primeira vez que vim passear e conhecer meus sogros, passei pouco mais de um mês. Foi muito dificil ele aceitar que eu nao passaria o natal com ele! Quando vim meio sem saber se ficaria ou não, tive que pisar em ovos para contar a novidade! Imagina agora com ele nessa situação?

Os últimos 3 dias no Brasil foram cheios de conflitos! Meu pai fazendo mil comentários sobre minha vinda, dando indireta, e eu dando minhas razões racionais. Choramos, até discutimos! Sei que na verdade ele não me entende. Eu tenho medo de um dia sentir remorso por isso, mas a verdade final para mim é isso: a gente toma decisões que tem consequências. Maturidade é saber levar as consequências. Minha consequência é passar menos tempo com minha família, e vir a sentir remorso por isso.

                O problema maior, além do que eu sinto, ou meu pai sente, é que ele piorou! Desde o começo eu já estava pensando como eu conseguiria ir embora deixando meu pai lá daquele jeito. Ele estava andando com dificuldade, falando com dificuldade. Dei sorte e consegui ir numa consulta com meu pai. O médico estava ainda esperando o resultado da ressonância do crânio (por conta da visão dupla). Ele receitou um remédio novo para dar mais ânimo. No final me disse para voltar pros Estados Unidos tranquila que meu pai ainda iria ficar firminho por um tempo. Ele deixou escapar que o fato de meu pai ter ficado tanto tempo bem sem a quimio foi uma surpresa.

                Tive outra sorte que no dia de ir pro aeroporto a ressonancia ficou pronta, e consegui ver o resultado. Nada de metástase cerebral (ufa!). Acabou que deixei meu pai relativamente bem, mais conformado com minha volta.

                No dia seguinte ele fez um exame de punção lombar (a ressonancia apontou uma alteração que pode ter ligação com infecção). E ele começou a passar mal! Foi só eu vir embora, ele piorou mais ainda! Um dos meus queridos primos levou meu pai para o Hospital, ele estava fraco, comendo pouco. Fizeram uma retirada de liquido do pulmão (há um tempo estava acumulando liquido), e o internaram. Ele ficou internado quase uma semana! E dormiu sozinho quase todos os dias. Minha tia foi todos os dias, meu irmão passou o final de semana. Mas o resto do tempo ele ficou sozinho.

                Foi uma semana dificil, em que a distância só faz tudo piorar. Se eu estivesse lá poderia ficar o tempo todo com ele, por exemplo! Pensei em tantas coisas. Quando eu ficava no hospital com minha mãe eu sempre achava triste as pessoas que não tinham ninguém lá. A gente julga muito sem saber, sem se colocar no lugar. A verdade é que ter alguém doente na família envolve sempre muita gente, de formas diferentes. Se alguém fica doente por 3 meses (como foi minha mãe) é mais fácil pessoas deixarem o trabalho, familia, casa, se virar em mil e dar um jeito de ficar lá com a pessoa. Minha mãe ficou doente de maio a agosto, julho inteiro eu e meu irmão estávamos de férias! Ela estava na mesma cidade que a gente. Nós estavamos em choque! Não deu tempo de incorporar a doença a vida.

                Com meu pai não. É tudo ao contrário.

               
                Uma pessoa encontrou um dia meu pai na rua e chorou pra ele, talvez com pena, e disse algo do tipo: “Não acredito que sua filha de largou aqui assim”. Essa mesma pessoa disse algo parecido para uma de minhas tias. Até entendo que esta pessoa não goste de mim, e não me incomoda o comentário em si. O que me incomoda é a resposta das pessoas que gostam de mim. Sou contra dramatizar o que já é dramático. Ouço muitas coisas: “Não da pra você ficar mais?”. Se desse, eu ficava!  “Ai que pena, seu pai gosta tanto de você aqui”. Sim, eu já sei. “Nossa Aline, seu pai ta tão magro!”. Eu sei, ele também sabe. Uma outra pessoa muito querida um dia me disse: “Ah, mas seu pai não dura muito, ne?”. Quem sabe né? Um colega do meu pai levava o sogro com câncer no hospital toda semana, e as vezes nos encontrávamos. O sogro morreu ontem, um radialista de Cruzeiro. O genro,colega do meu pai, morreu meses atrás!  Quem sabe quem morre quando ne? Concordo que as chances do meu pai ir antes de mim são muito altas. Mas quem sabe? Ningúem!

                Meu pai fica chateado comigo as vezes porque ele acha que eu não tenho fé, que eu não acredito. A verdade é que eu acredito e muito que a gente pode se surpreender com o andamento de doenças. Acredito sim que existe mais do que a gente vê. Mas também leio muito sobre câncer, sei os tratamentos usados para canceres como do meu pai, sei as estatísticas, todos os numerozinhos de um dígito. Minha racionalização é: simplificar tudo! Sem drama, sem lágrimas desnecessárias, sem querer adivinhar o futuro, saber quando, quem, onde. No fim a gente tem mesmo que viver um dia por vez! Hoje estar feliz, sobreviver por hoje, viver sem culpa por hoje.

                Meu pai saiu da internação bem melhor. Mudou-se pra perto da minha vó e minha tia, trancou nossa casa. Eu sei que foi melhor pra ele, ele está já bem melhor e animado, tendo mais pessoas por perto, mais assuntos. Começou de novo as quimios. Fiquei melhor também! Esta semana, quando ligo pra ele, ele sempre está animado, falante, com a voz forte, cheio de assunto. Isso é vida, não?

sábado, 18 de janeiro de 2014

Semana dificil

Estou precisando escrever aqui urgentemente. Voltei pros Estados Unidos ha quase duas semanas  e esta semana tem sido muito dificil, meu pai piorou, não estou la e tenho pensando em muitas e muitas coisas. Pra resumir, culpa. Muitos conflitos dentro de mim! Hoje, depois de muito tempo, chorei muito, de doer o peito e faltar o ar. Dificil! Ainda vou escrever mais outro dia. Vim aqui rapidinho porque nao quero esquecer algo que acabei de pensar. Nao posso estar la agora, e nao quero mais me martirizar por isso. Eu so quero ter a chance de ainda cuidar do meu pai. Espero que o tempo dele seja tbm o meu.