quarta-feira, 23 de julho de 2014
A história que não nos define
Leio e escuto muito que a gente não deve deixar a dor nos definir. Concordo. Mas eu ainda caio sempre nesta armadilha. Eu facilmente conto para as pessoas que meus pais morreram, como se essa fosse minha história principal. É quase a minha resposta para "De onde você é?". É definitivamente minha resposta para "Quem é você?".
As vezes eu tento pensar que sou forte, e que ando pra frente. Mas eu sei que ainda deixo essa dor me definir. Estar numa cidade nova ajuda nisso, como se eu sentisse uma necessidade de compartilhar essa história com essas novas pessoas que não me conhecem. Como se essa história ajudassem as pessoas a me conhecerem.
Esses dias uma pessoa me perguntou se eu tinha irmãos, e onde eles moravam. Ja fui logo respondendo que meu irmão morava em SP, e que éramos somente eu e ele, que meus pais já tinham morrido. Eu falei bem natural, como se contasse que tinha perdido o ônibus de manhã. Contei no meio de um bar, assistindo aquele jogo Brasil e Alemanha. Sim, total falta de senso. Depois me arrependi. A pessoa levou um susto, e parou de fazer perguntas. Acho que ela se sentiu mal, achando que tinha perguntado demais, e tinha me feito lembrar de algo triste. Como se eu esquecesse...
Hoje também estava falando com outra pessoa sobre ter mania de doença, e já fui logo explicando a minha hipocondria pelo fato que meus pais tiveram cancer. Estava eu lá, de novo, aproveitando uma brechinha para contar para as novas pessoas que conheço sobre a verdadeira história que me define.
"Nós somos moldados por nossas experiências, não definidos por elas. Elas são, de certo modo, parte de nós"
Eu sinto que gastei (e gasto) muito da minha energia remoendo a minha história. E isso é péssimo. Olhando para trás, um pouquinho, percebo que muitas horas que poderiam ter sido gastas com leitura, amizades, momentos alegres, atividades para o meu desenvolvimento como pessoa, foram gastas com emoções pesadas, em momentos de extrema solidão. Como se o luto, a angústia, e o ressentimento fossem uma bagagem super pesada que eu carregasse, me impedindo de ir mais rápido para onde quer que seja.
Ao mesmo tempo, como seria possível fazer o contrário? Aconteceu que grande parte da minha década dos 20 foi muito marcada com essa história, do cancer, da morte, da perda. Eu não quero mesmo que essa dor me defina, mas também não acho ser possível eu ser algo além de alguém que carregue essa dor. Como alguém vai ser meu amigo sem conhecer essa história que faz tanto parte de mim? Como ter um relacionamento 100% aberto com alguém que não aceite a minha dor e história como partes de mim?
Talvez o certo seja lutar para não ficar estacionado no momento da dor. Talvez o certo seja pegar a dor, com todo o seu peso, colocar na mochila, e seguir em frente. O peso até vai atrapalhar, e vai sim fazer a caminhada mais lenta. Mas la na frente a gente vai ficar mais forte, não vai?
Essa é minha história, e ela faz parte de mim, não vou apagar, nem quero apagar. A mesma história que me faz pesada, também me faz forte. Que a força e a coragem nos definam!
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